Estreias

domingo, 15 de novembro de 2020

Crítica - 'The Beach House'

 

    O terror cósmico vem ganhando cada vez mais notoriedade no cenário atual. Sob a influência da literatura de H.P. Lovecraft, o subgênero idealizado a partir da miscigenação de figuras ocultas/ancestrais e inexplicáveis a mente humana é a essência de ‘The Beach House’.  Sem aquela mega produção por trás, a estreia do diretor Jeffrey A. Brown é surpreendente.            

    O roteiro também assinado por A. Brown, acompanha a chegada do casal adolescente Emily (Liana Liberato) e Randall (Noah Le Gros) a uma casa de praia, a fim de aproveitar seu período de férias. Entretanto, as circunstancias não saem conforme planejado e se torna um verdadeiro terror.           

   Aqui, quanto menos souber sobre a trama melhor a experiência. Pois, ‘The Beach House’ tem como seu principal aliado o medo pelo desconhecido. Dessa maneira, a direção assinada por Brown é certeira ao construir uma atmosfera enigmática, angustiante e cada vez mais lúgubre envolto de diálogos pontuais construindo sua protagonista. Pouco a pouco, diálogos após diálogos e pequenos contratempos é o ponto de partida para instaurar o horror.               
 
  Apesar do filme cair na sentença “demora para acontecer” pode gerar um descontentando do público em geral, porem tal assertividade é compreensível pelo diretor a fim de provocar o medo pelo desconhecido e a ansiedade ao espectador.  A partir da segunda metade, o filme toma novas formas e as ideias lovecraftianas, o body horror e as imagens sugestivas impressionam.       

   Nessa atmosfera dúbia e apavorante, a atriz Liana Liberato prende a atenção do público provando do pavor em que ela se encontra e sua determinação de sair daquela situação o quanto antes. O mesmo não se pode dizer do ator Noah Le Gros - abaixo da média e sem muito a oferecer.      

   Mesmo sabendo de suas limitações financeiras deixando de explorar certos elementos na trama com enorme potencial. Jeffrey A. Brown entrega um ótimo trabalho em sua estreia e ‘The Beach House’ é uma ótima sugestão para os fãs do gênero, principalmente para aqueles dos terror cósmico. 



NOTA: 7,1

                                    
 
 

domingo, 12 de julho de 2020

Crítica - 'A Assistente (The Assistant)'


   É com grande tristeza dizer que se tornou corriqueiro depararmos com notícias de mulheres sofrendo por abusos sexuais. Recentemente, a produtora cinematográfica Miramax se tornou alvo de tal atitude provocando um forte descontentamento com as mulheres do mundo todo que iniciaram o movimento #Metoo. O grande nome por trás das acusações, Harvey Weinstein surpreendeu a todos com fortes declarações cabendo a ‘The Assistant’ mostrar o sórdido ambiente e de como é a vida daquelas sob o martírio do assédio.        


     Ao invés de optar em apresentar ou mencionar Weinstein, a direção e o roteiro assinado por Kitty Green (conhecida pelo ótimo documentário ‘Quem é JonBenet’) priva sob o olhar da assistente Jane (Julia Garner, conhecida pela ótima série ‘Ozark’) diante das circunstancias de sua rotina em seu ambiente de trabalho comandado por um poderoso executivo.   

     Diferente de como realizou o recente ‘O Escândalo (2019)’ documentado as especificidades dos abusos, os relatos das vítimas e suas consequências. ‘The Assistant’ promove um olhar minimalista ao transgredir os abusos para a apreciação do público de forma indireta soltando algumas pistas. Além de explorar o assédio constante e o controle abusivo praticado por alguém superior remetendo o ex-produtor, bem como os efeitos devastadores de tal opressão sobre a protagonista. 

 Nesse cenário, a atmosfera criada por Kitty Green em simplesmente acompanhar a rotina de Jane é sufocante e ao mesmo tempo desconfortável, pois sabemos que, ali, há uma ameaça subjetiva controlando todo aquele ambiente. Sua função de agendar um horário, atender telefonemas, recolher o lixo não é gratificante e sim, muito pelo contrário. Há um ar pesado, carregado e sufocante para Jane exprimir todas as suas emoções e diante desse fato, a atuação de Julia Garner é genial em uma das melhores interpretações intimista nos últimos anos. Seu modo de agir, sua postura corporal e seu olhar diz muito sobre aquele local e infelizmente, reflete o verdadeiro estado emocional de muitas mulheres. 

   Se de um lado a direção de Kitty Green é certeira em reconhecer sua proposta diante de uma mulher vexada sob os escombros de um sistema corrupto gerando um forte grau de verdade em tela. Por outro, o ritmo por vezes maçante e sem proporcionar um grand finale pode desanimar boa parte do público mais casual. Entretanto, estamos diante de um cinema denuncia não sobre Weinstein ou outra figura de mesma índole, mas sim daquelas que se recusam a elevar-se diante deles e apresenta a melhor resposta daqueles que questionam o porquê as mulheres ficam em silencio por tanto tempo.

    ‘The Assistant’ promove uma forte reflexão daqueles que se colocam acima da lei por estar em uma melhor posição institucional e cala a boca daqueles que opinam sem vivenciar o que de fato uma mulher passa.


NOTA: 7,2
 
 
                                                                                                   

domingo, 7 de junho de 2020

Crítica - 'Devorar (Swallow,2020)'


    ‘Devorar’, o infeliz reflexo das indiferenças e imposições de nossa sociedade atual diante da figura da mulher.  Sob o olhar feminino, a primeira obra do cineasta Carlo Mirabella David é rica em sua complexidade ao entregar uma sensibilidade ímpar envolto da desgraça alheia. Aqui, o cinema denúncia camuflado nas metáforas carrega uma forte mensagem a ser repensada e instruída para todos nós. 

   A trama acompanha a dona de casa Hunter (Haley Bennet) que logo após descobrir sua gravidez de seu recém-marido Richie (Austin Stowell), desenvolve a síndrome de alotriofagia, ou seja o desejo de comer substancias não nutritivas como, gelo, terra, pilha, papel e entre outros. A partir disso, todos buscam ajudá-la, porém no decorrer do processo notamos que este é o mais simples de seus problemas.                            
 
   A narrativa aparentemente sem sentido ou pouco convidativa em sua premissa pode passar despercebido para muitos, porém quanto mais nos aprofundamos mais relevante e impactante ela passa ser. Nesse contexto, a direção do estreante Carlo Mirabella David é genial ao estruturar uma vida perfeita ao casal a partir da belíssima casa em que residem, o super emprego de Richie e a novidade da gravidez, tudo capturado por uma iconografia limpa, superficial e metafórica contrapondo os personagens mediante a sua importância social. Em meio a essa plenitude aparente, notamos algo diferente no comportamento de Hunter mesmo antes de desenvolver sua síndrome e quando a desenvolve; o cineasta recria uma atmosfera aterrorizante da maneira mais intima possível tornando ‘Devorar’ um belo e excêntrico filme.                
                
   A partir daí, ‘Devorar’ ganhar contornos obscuros ao gerar a apreensão e desconforto no espectador a partir da sugestão, ou melhor do que Hunter pode ingerir. Entretanto, não estamos diante de uma obra para nos fazer chocar, mas sim para nos fazer refletir e sentir o processo pelo qual levou a protagonista estar onde chegou. Conforme o longa progride, novas revelações vem à tona e, assim, o filme entra em uma zona de desconforto ao abordar temas relevantes nos dias atuais sobre a patologia, a psicopatologia, a solidão, o sentimento de culpa, o peso dos traumas, o controle da mulher com seu próprio corpo e o controle que a sociedade impõe com o corpo feminino. 

   Em meio a esse caos, a atriz Haley Bennet entrega uma atuação perfeita na situação em que sua protagonista se encontra, transmitindo uma naturalidade forçada seja pela sua forma de agir, falar ou seus maneirismos, bem como seu desconforto, retração e  controlada pela família presunçosa do marido. O mesmo não pode se dizer para o fraco ator Austin Stowell que se prende a um papel convencional de um magnata mimado, perdendo a chance de criar um dos personagens mais odiados do cinema.              

  Sem manter o mesmo ritmo lento nos primeiros atos, a direção do estreante Mirabella David soa apressada no último ato ao investir em resoluções rápidas dos casos e acaba destoando a atmosfera estabelecido inicialmente. Felizmente tal fator não interferiu na forte mensagem de sua produção perturbadoramente sensível diante da jornada do subconsciente de uma mulher traumatizada, fragilizada e tornada impotente na figura de um casamento aparentemente ideal. Não há como negar, esse filme é um prato cheio para todos os estudantes e formados em psicologia.   

   ‘Devorar’ como o próprio título menciona é uma forte metáfora do quanto uma mulher precisa engolir durante toda a sua vida as imposições, os traumas, as injustiças, as indiferença, um casamento abusivo e as cobranças pela família do próprio conjugue. O final é um tapa na cara daqueles que levantam um dedo, eleva o tom de voz, subestimam e duvidam da capacidade, do valor e do caráter de uma mulher.  

NOTA: 7,5
                         

segunda-feira, 1 de junho de 2020

TOP 10 - Melhores Atuações Infantis do Cinema


    Geralmente, quando falamos de melhores atuações, nos referimos apenas aos atores renomados que já possuem uma história firmada no mundo da sétima arte. Apesar de muitos deles entregarem performances brilhantes já adultos, às vezes esquecemos que também foram espetaculares quando crianças.

    Quando muitos listam as melhores atuações femininas e masculinas de todos os tempos no mundo do cinema, poucos deixam de lado a criançada que muitas vezes entregam uma atuação tão madura quanto os veteranos. Provando a arte no domínio da dramaturgia emocionando até o espectador mais “durão”. 

    Na difícil tarefa de escolher apenas alguns títulos em um universo tão rico e variado, o Filme Na Mente listou um top 10 das melhores atuações infantis da historia do cinema, com base em atuações que marcaram e até hoje permanecem na cabeça de muitos cinéfilos entre as idades de sete a quatorze anos. Confira:



10º - Hailee Steinfeld, Bravura Indômita (True Grit, 2010)



      Despontando nas telas do cinema aos treze anos, a atriz Hailee Steinfeld  provou seu talento puro na icônica personagem Mattie Ross, outrora protagonizada por Kim Darby. Felizmente, a atriz não sentiu o peso da personagem e entregou uma atuação superior ao clássico e contracenando de igual para igual com Jeff Bridges e Matt Damon. Hailee Steinfeld definitivamente carimbou seu nome na Industria em seu primeiro filme da carreira, garantiu sua nomeação ao Oscar de melhor atriz Coadjuvante e hoje considerada uma das melhores de sua geração.




9º - Henry Thomas, E.T. (E.T., 1982)


      Em meio a tantas virtudes, um dos chamariz do clássico de Spielberg é a comovente e simpática atuação do ator Henry Thomas. Sua ótima performance criando um forte vinculo de amizade com um E.T e criando diferentes camadas emocionais a seu personagem. 'E.T' não funcionaria sem a sua atuação. Infelizmente, sua carreira não foi tao longe quanto seu talento apresentado no filme e caiu no ostracismo. 




8º - Christian Bale, Império do Sol (Empire Of The Sun, 1987)


     Mais um sob o comando do diretor Spielberg, o ator Christian Bale protagonizou o coming-of-age 'Império do Sol'.  Bale construiu um personagem complexo passando de um simples estudante inocente a um  prisioneiro de guerra. Durante essa jornada, sua atuação conquista o coração do publico entregando uma intensidade dos mais puros sentimentos. 




7º - Jacob Tremblay, O Quarto de Jack (Room, 2015)




O futuro do cinema se chama Jacob Tremblay. Carimbando seu nome com apenas nove anos de idade, sua excelente atuação em 'O Quarto de Jack' rendeu não apenas uma indicação ao Oscar de Melhor ator Coadjuvante, como também um futuro brilhante em Hollywood. Conhecido posteriormente pelas ótimas atuações em 'Extraordinário' e 'O Sono da Morte'. É bem provável que veremos mais vezes seu nome em futuras premiações. 




6º - Linda Blair, O Exorcista (The Exorcist, 1973)



     Quando se fala em 'O Exorcista' o primeiro pensamento que vem em nossa mente é: quem é essa atriz possuída? Considerado o grande clássico do terror, a atriz Linda Blair com apenas treze anos entrega uma atuação visceral, impetuosa, assustadora e arrepiante na pele na pequena garota Regan possuída por uma entidade misteriosa. Sua ótima atuação garantiu sua indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. 




5º - Natalie Portman, O Profissional (Leon, 1994)



Apresentada no cinema aos doze anos de idade em 'O Profissional',  Natalie Portman mostrara seu talento nato desde pequena. Quando a atriz é introduzida como Mathilda, ela se mostra determinada, porém indiferente como uma garota tormentada pela sua família desestruturada. Quando sua família é assassinada, ela supera sua dor e busca vingança. Em meio as estas nuances, Portman dá um show de interpretação, rouba a cena contracenando com Jean Reno e Gary Oldman, e hoje é considerada uma das melhores atrizes de Hollywood. 




4º - Anna Paquin, O Piano (The Piano, 1993)


     Apresentando seu talento desde os onze anos de idade, Anna Paquin arrebata o coração de todos em 'O Piano'. A atriz  usa a seu favor a energia e a inocência de sua idade e constrói sua personagem, Flora a partir da amável e conturbada relação com sua mãe, Ada. Além de chamar a atenção de todos pela sua atuação remetendo a voz da mãe, Anna Paquin transmite um sensibilidade impar a trama garantindo o premio de melhor atriz  Coadjuvante no Oscar de 1994! 




3º - Zain Al Rafeea, Cafarnaum (Capernaum, 2018)



‘Cafarnaum’ amplia os olhares do público a triste e desoladora realidade das crianças ao redor do mundo, em especial no Líbano.  Forte, pungente e difícil por trazer em tela um realismo absurdo. O filme foca na adversidade enfrentada por uma criança de doze anos em um país onde a cultura é muito diferente da nossa e tem como mote mostrar as consequências de um garoto ao processar os próprios pais. No centro de tudo, está a atuação fenomenal de Zain Al Rafeea transmitindo todo o esgotamento físico, emocional, desolação, afeto e compaixão. Melhor atuação do século e merece o terceiro colocado. 



2º - Jodie Foster, Taxi Driver (Taxi Driver, 1976)


 Jodie Foster é uma das melhores atrizes da sétima arte. Atuando desde os cinco anos de idade, foi aos doze em que Foster provou seu talento interpretando uma garota prostituta em 'Taxi Driver'. Sua atuação transmitindo a vulnerabilidade de sua personagem, e ao mesmo tempo uma esperteza fora do comum, serve como o ponto de ruptura do personagem Travis Bickle (Robert De Niro). Sob o comando de Scorcese, Foster foi indicada  a melhor atriz coadjuvante no Oscar e injustiçada por não levar o premio. 




1º - Tatum O' Neal, Lua de Papel (Paper Moon, 1973)



     Tatum O' Neal é a atriz mais jovem a ganhar o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante aos dez anos de idade. E com total merecimento! Considerado um dos melhores filmes da história do cinema, 'Lua de Papel' encanta o público não apenas pela sua estória, mas sim pela atuação irretocável de O'Neal e sua química prazerosa com Ryan O'Neal, afinal pai e filha na vida real não tinha como ser diferente. Apesar do grande sucesso de Ryan, é Tatum que roubou os holofotes e conquistou o espectador seja pela a simpatia, doçura, inocência, esperteza e manipulação de sua personagem, Addie. Em meio a tantas qualidades, é  Tatum O' Neal o cerne de 'Paper Moon'. 



MENÇÕES HONROSAS:

11º - Salvatore Cascio, Cinema Paradiso (Cinema Paradiso, 1988)



O nosso querido é clássico personagem Toto não poderia deixar de ser relembrado. Considerado pelo critico que vos escreve o melhor filme da história do cinema,  o ator Salvatore Cascio representa a paixão pelo cinema, os cinéfilos, os diretores, os atores - todos os amantes da sétima arte! Sua performance com um brilho no olhar vislumbrando pelo Cinema Paradiso e sua simpatia em tela, conquista todo o espectador em uma belíssima história.  



12º - Haley Joel Osment, O Sexto Sentido (The Sixth Sense, 1999)


Conhecido pelo famoso bordão "I see dead people", o ator Haley Joel Osment conquistou uma legião de fãs ao protagonizar ao lado de Bruce Willis o clássico dos filmes de suspense 'O Sexto Sentido'. Brilhante como ator mirim provando seu talento também no ótimo 'Inteligencia Artificial'. Infelizmente sua carreira não decolou mesmo após o grande sucesso quando pequeno. 


13º - Kirsten Dunst, Entrevista com o Vampiro (Interview With The Vampire, 1994)


Indicada ao Oscar de Melhor atriz Coadjuvante em 'Entrevista com o Vampiro', a famosa Mary Jane provou seu talento aos onze anos de idade interpretando a vampira, Claudia. Seu sucesso foi tanto no filme que sua atuação supera as de Brad Pitt, Tom Hanks e Antonio Banderas. Hoje Kirsten Dunst é considerada uma das melhores atrizes de sua geração. 


14º - Enzo Staiola, Ladrões de Bicicleta (Ladri di Biciclette, 1948)



Obra-prima do movimento neorrealista do cinema, Enzo Staiola protagoniza um dos momentos mais memoráveis da historia do cinema na cena final de 'Ladroes de Bicicleta'.


15º - Macaulay Culkin, Esqueceram de Mim (Home Alone, 1990)



     Enquanto, muitos o colocavam como a grande promessa do cinema após o grande sucesso ao protagonizar a trilogia 'Esqueceram de Mim', o ator Macaulay Culkin nunca mais obteve o mesmo  prestigio e caiu no ostracismo. 

16º - Quvenzhané Wallis, Indomável Sonhadora (Beast of the Southern Wild, 2012)



Indicada ao Oscar de Melhor Atriz aos sete anos, Quvenzhané Wallis é a alma do filme e atinge um nivel de atuação incomum para sua idade envolvendo o espectador em seu universo imaginário. 





                                  

sábado, 25 de abril de 2020

Crítica - 'O Segundo Cordeiro'


   De uns anos para cá, o gênero terror se reinventou e voltou a ganhar notoriedade no cenário atual. Com uma safra de ótimos filmes de diferentes subcategorias como o psicológico em ‘A Bruxa’, o sobrenatural de ‘Invocação do Mal’, o sensorial de ‘Midssomar’ e o cósmico em ‘O Farol’, abriu caminho para um futuro promissor. Em meio a essa nova leva do Pós-Terror surge o controverso, ‘O Segundo Cordeiro’. 

   A trama acompanha Selah (Raffey Cassidy), uma jovem nascida e criada dentro de um culto feminino liderado pelo pastor Shepherd (Michiel Huisman), que começa a questionar  sua criação e o ambiente em que se encontra.     

     A direção assinada pelo polonês Malgorzata Szumowska soma elementos narrativos da série ‘The Handmaid’s Tale’ e a atmosfera de ‘A Bruxa’ e constrói sua obra com um apuro técnico invejável e apoiando-se no terror contemplativo. Provando de vários enquadramentos como o plano detalhe com o suave movimento de câmera, o bom e eficiente uso do contra-plongéé usado em diferentes ocasiões, a adição do zoom in causando paranoia, a inserção de focar e desfocar um mesmo plano e a grande angular denotando o ambiente denso das florestas somado a profundidade de campo situando os personagens centralizados ou no primeiro terço da tela.  Resulta em uma cinematografia assustadoramente belíssima e requintada tornando cada frame uma verdadeira pintura.

  Porém, se tecnicamente ‘O Segundo Cordeiro’ é irretocável o mesmo não pode se dizer de seu roteiro. A história não explora todos os seus personagens e pouco vai além de sua própria sinopse. Basta notar as atuações de Michiel Huisman e Raffey Cassidy que mesmo sendo muito boas conforme foi estabelecido, ambos não tem material suficiente para criar camadas em seus respectivos papeis. Diferentemente de Sarah (Denise Gough ótima em cena) que é a personagem mais interessante da trama ao lidar com emoções mais complexas como, sua luta contra as decisões de Shepherd, bem como o desamparo e desgosto sob seu olhar do patriarcado tomar vantagens em cima das mulheres.   
 
 Entrando para a nova safra do Pós-Terror tendendo ao psicológico e contemplativo envolto de uma temática forte a respeito do quão preocupante a influência do patriarcado pode gerar a vida das mulheres. ‘O Segundo Cordeiro’ tinha todos os elementos para ser o novo clássico do cinema e gerar discussões envolto de seu tema, porém não o faz e  apoia-se em  apuros técnicos e visuais.

NOTA: 6,9

sábado, 18 de abril de 2020

Crítica - 'Magnatas do Crime'


   Após algum tempo afastado do mundo dos crimes, Guy Ritchie retoma a sua assinatura autoral em grande estilo como nos bons e velhos tempos. Sua identidade cinematográfica marcante desde a sua estreia no ótimo ‘Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes’ e, posteriormente em ‘Snatch: Porcos e Diamantes’ conquistou milhares de fãs ao redor do mundo. Sem sucesso em suas últimas produções com maior apelo comercial, o cineasta volta as suas origens e surpreende em ‘Magnatas do Crime’. 

   Sua autoria é notada logo de cara ao sugerir a metalinguagem como o combustível para a narrativa central via um roteiro que o personagem Fletcher (Hugh Grant) tenta vender para Ray (Charlie Hunnam), o fiel colega de trabalho do mafioso Michael Pearson (Matthew McConagey). Por sua vez, Pearson buscar se aposentar das noites de crimes e vender o seu bem sucedido império de maconha para os bilionários de Oklahoma.       

   O roteiro também assinado por Guy Ritchie é mais uma daquelas suas estórias aparentemente complexas contando inúmeros personagens marcantes, diálogos afiados, linguagem colorida, saltos temporais e reviravoltas de cair o queixo. Seguindo o seu estilo tão bem conhecido, o cineasta recicla bons momentos de seus antigos projetos e por mais que alguns possam o criticar por essa circunstancias de repetir seu feito em suas produções passadas. Quer saber? Funciona! E funciona tão bem que surpreendentemente entrega um dos melhores filmes de sua carreira.         

   Quem é pouco familiarizado, o primeiro ato pode parecer confuso com a inserção de vários personagens e o linguajar frenético de Fletcher contextualizando seu ponto de vista a Ray. Porém, aos poucos começamos a simpatizar e compreender as motivações de cada um dos envolvidos da máfia e quando menos esperamos, já nos acostumamos com o ritmo e a edição empolgantes de Ritchie. Aliás, o motivo para tamanha conquista do espectador está nas excelentes interpretações do trio Hugh Grant,  Charlie Hunnam e Matthew McConagey tornando seus respectivos personagens marcantes cada um com suas peculiaridades distintas e bem definidas.

   Navegando por diferentes gêneros de crime, ação, comédia e cheio de reviravoltas. ‘Magnatas do Crime’ é empolgante, tem um bom valor de entretenimento e marca o retorno triunfante a essência de Guy Ritchie. 
 

NOTA: 8,0
        

segunda-feira, 30 de março de 2020

Crítica - 'O Poço (El Hoyo,2019)'



‘O Poço’ não poderia deixar de estrear no momento mais propício frente ao caos do cenário mundial atual. Em meio a pandemia do COVID-19, o longa-metragem espanhol lançado pela plataforma da Netflix surpreendeu a todos ganhando escalas gigantescas ao redor do mundo, tornando-se o filme mais comentado nos últimos dias. Afinal, sua verdadeira mensagem é o infeliz reflexo da sociedade moderna. 

A trama acompanha Goreng (Ivan Massagué) confinado sob o mecanismo de uma penitenciaria vertical em que os presidiários localizados nos pisos superiores são beneficiados, pois recebem um banquete. Enquanto, os dos pisos inferiores recebem os restos ou nada, restando a eles a luta pela sobrevivência. 

O cineasta espanhol Galder Gaztelu-Urrutia estreia com o pé direito atrás das câmeras ao mesclar o suspense social e a fabula kafkiana diante da natureza humana frente a um sistema corrompido. Sua direção prova como tornar uma obra eficiente mesmo tendo em mãos uma proposta geral simples, beneficiando-se da plataforma como o elemento condutor para as metáforas. Dessa maneira, a ótima premissa é desenvolvida com tamanha precisão no primeiro ato favorecendo a imersão do espectador, a partir dos questionamentos entre Goreng e Trimagasi (Zorion Eguileor) . 

Não só isso, Gaztelu-Urrutia prova de recursos técnicos para aproximar o espectador da densa trama e gerando um forte senso de misterio, seja pelo design de produção minimalista e claustrofóbico ou pelo intrínseco design de som em sons diegéticos como o barulho da plataforma, a queda dos malfeitores, as ranhuras nas paredes e o silencio. Lembrando, ‘O Poço’ sugere cenas desconfortantes, gráficas e uma violência pungente refletindo uma visão cética da condição humana, mesmo com relances de otimismo.          

Porém, o cerne do filme está em seu roteiro alegórico com personagens complexos e temas coniventes com a sociedade moderna. A narrativa moldada no capitalismo desenfreado, no egoísmo, no individualismo, sob o pensar no seu próprio bem estar e o outro que lute contra a solidariedade, a consciência coletiva, a inocência e a esperança. Em meio a essas asserções as metáforas são bem inseridas gerando diferentes interpretações. 

Com uma trama rica em metáforas e com fortes críticas sociais, ‘O Poço’ é um daqueles filmes que vai ficar em nossas mentes após o final dos créditos e se insere em um momento chave no contexto atual nos fazendo refletir sob nossas atitudes.        


NOTA: 8,0

SPOILER

Diante de várias metáforas, as críticas sociais sobre o capitalismo, socialismo, desigualdade, luta de classe, consumismo e o comportamento humano tange apenas as mensagens explícitas. Sabendo que ‘O Poço’ vai muito além disso. Há muitas referências a serem percebidas, entre elas estão os elementos bíblicos citados ao longo do filme.    
Sendo assim, a plataforma é uma forte alegoria a Torre de Babel distanciando o céu do inferno entre 333 andares (2 pessoas em cada cela), ou seja 666 homens no total.  O personagem Goreng é retratado como o próprio Messias. A Imoguiri representa a empatia e Baharat a fé chinesa. Enquanto isso, a alta administração são os regentes desse sistema capitalista.         
A jornada de Goreng é justamente sacrificar por todos e mostrar a esperança, a fim de romper o sistema. Durante esse processo ao lado de Baharat, contemplamos os sete pecados capitais. A soberba (o homem de cabelo grisalho mencionando ser merecedor de estar no piso superior), a ira (os responsáveis pela morte de Miharu), a luxúria (dois sujeitos pelados na piscina), a preguiça (a mulher com travesseiro), a gula (o garoto com síndrome de down), a ganância (o velho que estava com o dinheiro) e a vaidade (o rapaz detentor de um violino). 
Quando ambos chegam ao fundo do poço, nenhum dos personagens conseguem sobreviver. A visão de Goreng ao encontrar uma criança em ótimo estado no último piso não passa de seu subconsciente, pois a enxergava como a esperança, a inocência e o futuro da humanidade. Por fim, o filme termina com a criança sendo levada aos céus, ou melhor, a verdadeira mensagem sendo entregue ao público para fora do poço. Ou seja, cabe a nós espectadores decifrarmos se este recado será efetivo ou não em nosso espirito moral.