Refilmar um clássico do cinema nem sempre é o melhor dos
caminhos. Há inúmeros exemplos de produções desonrando obras-primas cinematográficas, e pouquíssimas
conseguem a proeza de se igualarem, ou até mesmo serem superiores aos seus
precursores. Ninguém nunca irá tirar o mérito e a influência de 'Suspiria'
(1977) do mestre Argento, mas Luca Guadagnino merece aplausos pelo seu trabalho
com a nova roupagem do filme.
Situado na Alemanha em 1977, a bailarina Susie Bannion
(Dakota Johnsson) matricula-se na prestigiada escola de dança Markos Tanz
Company, e lá começa a ter progressos extraordinários ganhando a confiança da
tutora Madame Blanc (Tilda Swinton). Porém a morte de uma das bailarinas do
local ganha novas relevâncias e mistérios, tornando aquele ambiente não tão
agradável como parecia ser.
A direção assinada por Luca Guadagnino (conhecido pelo ótimo
‘Me Chame Pelo seu Nome’-2018) é inteligentíssima em criar sua própria
identidade cinematográfica afastando-se da técnica influente de Argento. Aqui
não há aquela paleta de cores saturadas, artificiais, representadas por tons
primários em meio à violência gráfica apresentada logo nos primeiros minutos. Guadagnino
trouxe alusões à estética de seu conterrâneo – imagem estetizada e movimentos
de câmera setentista -, mas também optou pela fotografia dessaturada,
reiterando uma atmosfera intimista e iminente, aproximando a obra do suspense
psicológico.
Mesmo não sendo visualmente intenso como o original,
Guadagnino eleva o cinema do terror/fantasia entregando não só uma, mas várias
cenas memoráveis em momentos chaves da trama. Estamos falando do fantástico
episódio dos movimentos de dança de Bannion causando a morte de uma colega,
como também da dança evocativa envolvendo a personagem Sara (Mia Goth, em
excelente atuação) hipnotizada, as sequências dos pesadelos... Tudo é
extremamente pontuado e famigerado, até a chegada da epopeia nos minutos finais
deixando qualquer um de queixo caído.
Mas não é só pela parte técnica que este novo ‘Suspiria’ se
diferencia, mas também pelo seu roteiro. Diferente do clássico, que 'guarda' a
bruxaria até sua conclusão, aqui este preceito é apresentado logo de cara,
favorecendo ainda mais a atmosfera idealizada por Guadagnino em prol do
suspense psicológico. São inseridos novos coadjuvantes: o psicoterapeuta Dr.
Josef e Patrícia. E novas subtramas retratando o passado dos personagens e as
consequências da 2ª Guerra Mundial.
Outro ponto fortíssimo nessa versão fica por conta das
ótimas interpretações de todo o elenco, mas principalmente de Tilda Swinton. A
camaleoa faz jus a sua espetacular carreira e da vida a três personagens
totalmente distintos: o médico Dr. Josef, a professora da escola Madame Blanc e
a Mãe Bruxa Markos. Quem também merece destaque é Chloe Grace Moretz; mesmo com
pouco tempo em tela, além da protagonista Dakota Johnsson e Mia Goth.
Reinventado um clássico, Luca Guadagnino dá uma aula de
cinema em 'Suspiria' nos presenteando cenas para entrar na história, e
proporcionando uma experiência única e pouco vista no gênero.
NOTA: 8,8