Estreias

terça-feira, 31 de julho de 2018

Crítica - 'Ilha dos Cachorros'


   Após nove anos, Wes Anderson retorna ao mundo da animação em grande estilo em ‘Ilha dos Cachorros’. Conhecido pelo seu caráter peculiar, o cineasta conhecido pelos ótimos filmes ‘O Grande Hotel Budapeste’, ‘Os Excêntricos Tenenbaums’ e ‘O Fantástico Sr. Raposo’, este ultimo sua única animação. Repete seu requinte autoral que o consagrou em uma trama original, relevante e oportuna nos dias atuais. 

   ‘Ilha dos Cachorros’ narra a história do tirano prefeito da cidade de Megasaki, Kobayashi, que adotou uma severa medida em proibir os cachorros de morarem no local, transportando todos a uma ilha vizinha repleto de lixo. Em meio a esse caos, o pequeno garoto Atari embarca em uma aventura para encontrar seu cachorro Spots. 

   A direção assinada por Wes Anderson novamente chama a atenção com seu estilo autoral.  A simetria dos planos, os movimentos verticais e horizontais da câmera, os pequenos detalhes na construção das diferentes locações e agora com a maior presença da cultura japonesa, estão todos presentes em ‘Ilha dos Cachorros’. Sua narrativa também não foge de seus padrões com toques de um humor inteligente e personagens com fortes personalidades.           
 

   Não apenas isso, o roteiro também com a assinatura de Anderson apresenta subtextos ricos, críticos e metafóricos. A começar pelo contexto político e social abrangendo o sectarismo, o regime político, o preconceito, a xenofobia e o valor da cultura. Esta última representada perfeitamente pela japonesa e concedendo uma linguagem diferente daquela praticada pelos cachorros, o inglês. Tal dicotomia reforça o dialeto próprio de cada espécie (não considerei nenhuma polêmica a respeito da apropriação cultural discutida por muitos). 

   A animação também não foge da elegância com criações de mundos fascinantes e uma aventura divertida. Todos os cachorros têm suas características marcantes, e as vozes dos atores Bryan Cranston (Chief), Edward Norton (Rex), Bill Murray (Boss) e Jeff Goldblum (Duke) são excelentes. Abaixo deles, Atari não dispõe de muito carisma e não sentimos os seus sentimentos pelo seu melhor amigo, o cachorro Spots.    

   Sem aquele toque Pixar ao tratar com veemência o sentimentalismo, ‘Ilha dos Cachorros’ é uma animação divertida, original, elegante, oportuna nos dias atuais e atinge o público de todas as idades.                         
 
NOTA: 8,2
  
                                            

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Crítica - '7 Dias em Entebbe'


    Após toda a celeuma por trás da recente polêmica série o ‘Mecanismo’, José Padilha retorna seus olhares no âmbito político em ‘Sete Dias em Entebbe’. Dessa vez, seu fato gira em torno do seqüestro do vôo da Airfrance que iria de Tel-Aviv a Paris, e sua missão de resgate, em 1976. E diferente de outros longas-metragens do cineasta, aqui ele busca encontrar o equilíbrio das diferentes visões dos envolvidos no escândalo.          

   ‘Sete Dias em Entebbe’ retrata o seqüestro do vôo da Airfrance (com 83 passageiros israelenses) orquestrado por dois alemães revolucionários (Daniel Bruhl e Rosamund Pike) e dois palestinos, desviando-o para a Uganda (liderada por Idi Amin) e exigindo a libertação de mais de 50 prisioneiros palestinos encarcerados em Israel. Diante de tal situação, o primeiro ministro Yitzhak Rabin tenta encontrar uma solução diplomática, mas cede a operação militar para resgatar os reféns.   

  Diferente de outros filmes de sua autoria, José Padilha da voz a todos os envolvidos respondendo as diferentes ideologias do ser “terrorista” e “guerreiros da liberdade”.  Para isso, ele não centra em apenas um núcleo narrativo, mas sim em vários transitando entre os dois alemães e palestinos (central), os reféns, a política de Yitzhak Rabin e um jovem soldado israelense. Como conseqüência, temos a montagem de altos e baixos de Daniel Rezende tendo como méritos casar os diferentes arcos na trama.
 

  O ponto negativo da montagem e resultando na vulnerabilidade do filme, está em sua narrativa fragmentada alternando entre os seqüestradores e o cenário geopolítico. Tal preceito torna a trama monótona – o arco central (dos seqüestradores) é abatido, sem provação dos eventos e sem comoção relevante até o terceiro ato. Os diferentes núcleos sugerem apenas um artifício trivial para o espectador simpatizar pelos personagens que no final, nenhum deles será lembrado.          
          
  Já o terceiro ato também apresenta seus pontos positivos e negativos. Se de um lado a montagem realizou um trabalho impecável associando a “Operação Thunderbolt” (operação nomeada do resgate) com uma apresentação de dança contemporânea, acompanhado de uma ótima trilha sonora. Do outro, a missão é passageira, fácil e isento de grande momento de batalha.       

   Com boas atuações de seu elenco principal, principalmente de Daniel Bruhl e Rosamund Pike e a boa presença de Nonso Anozie (Idi Amin). ‘Sete Dias em Entebbe’ se sustenta pelo seu interessante contexto histórico, mas deixa de lado personagens e eventos memoráveis.          

                   NOTA: 6,3                    

terça-feira, 24 de julho de 2018

Crítica - 'Custodia (Custody, 2018)'


  ‘Custódia’ é o reflexo da triste realidade da violência doméstica. A partir desse tema, o estreante roteirista e cineasta, Xavier Legrand nos coloca frente a frente a um conturbado relacionamento e uma pequena criança desamparada em meio ao caos familiar. O resultado é angustiante, triste, pungente e, infelizmente, factual perante o alarde do mundo atual. 

      O filme começa a todo vapor com uma cena no tribunal apresentando o pai, a mãe, seus respectivos advogados e a juíza. O casal disputa a guarda do filho, enquanto nós, espectadores, contemplamos em tempo real a audiência da juíza aos diferentes relatos de defesa. Verborrágico ao extremo e retratando a personalidades de cada um dos envolvidos, a dúvida paira sobre quem diz a verdade.  

   A principio pensamos em assistir a mais um filme de tribunal, mas o inteligente roteiro de Legrand é hábil ao intensificar os eventos do conflito familiar. Parte disso provém de situar o filho no centro da divergência dos pais, a ponto de esclarecer as motivações de cada um deles, assim como fazer o público sentir a angustia por trás de uma criança de apenas 10 anos. Assim, as ações e reações dos personagens têm um forte impacto narrativo por tudo ser tão verdadeiras em tela.     

   Tal realismo está na humanização dos personagens, o roteiro de Legrand não busca indicar quem é o mocinho ou o vilão, ou quem está certo ou errado. Tudo acontece com um propósito, todos os envolvidos no conflito têm suas próprias nuances, propiciando nas implicações da pós-separação reservando momentos de total descontrole. E assim brilha as atuações naturalistas do trio protagonista, o pequeno Thomas Gioria (o filho), a delicadeza encarnada por Léa Drucker (mãe) e a intensidade inquietante de Denis Ménochet (pai). 

   A direção de Legrand também se mostra presente ao valorizar uma imagem, ao invés de diálogos. Como visto na brilhante cena da festa de aniversário da filha Joséphine (Mathilde Auneveu), insinuando um perigo próximo apenas captando as ações dos personagens e deixando o som diegético tomar conta de todo ambiente.  Ou mesmo na cena de Joséphine no banheiro, com um plano estático.   

   Mais uma vez o cinema Francês se destaca no ano de 2018 carimbando os estreantes nomes, Xavier Legrand e  Thomas Gioria como futuras promessas. E ‘Custódia’ veio para retratar a dura e triste realidade da violência domestica em toda sua forma e plenitude.                


NOTA: 7,8


quinta-feira, 19 de julho de 2018

Crítica - 'A Mão do Diabo (2001)'


  O plot twist vem se tornando cada vez mais corriqueiros em inúmeros filmes do gênero suspense. De um lado, tal recurso narrativo serve mais como uma alternativa de conceder um desfecho surpreendente para um filme insignificante, ou também por não possuir seu papel de surpresa. Do outro, quando bem utilizado reserva momentos memoráveis, como é o caso de ‘A Mão do Diabo’.      

   A produção tem a assinatura de Bill Paxton (antes conhecido apenas pelo bom ‘Fish Head’) na direção e do estreante Brent Hanley no roteiro. Em meio a esses nomes poucos experientes em seus cargos, ‘A Mão do Diabo’ surpreende pelo consistente trabalho atrás da câmera de Paxton e a narrativa perversa cheia de dualidades de Hanley.

    Apropriando de temas irreverentes como fé x razão, a existência de Deus e o seu encargo sobre os acontecimentos cotidianos de cada um. Como conseqüência, novas reflexões ganham mais força a partir desses temas na sociedade atual e ‘A Mão do Diabo’ não entrega apenas uma boa reviravolta, mas sim uma mensagem efusiva e controversa.   

   No entanto, o filme não detém de um verdadeiro clímax para a chegada de seu plot twist e Paxton não busca inovar em sua decupagem. Dessa maneira, a narrativa se torna repetitiva mediante determinados eventos faltando criatividade na direção. Como exemplo, podemos citar o mesmo recurso técnico utilizado para as diferentes mortes realizadas pelo protagonista.                    
 
   Com ótima atuação de Matthew McConaughey com destaques aos atores mirins, Matthew O´Leary e Jeremy Sumpter. Além do bom roteiro do estreante Hanley surpreendendo a todos com uma boa reviravolta e abrindo espaços a novas reflexões a cerca dos temas abordados, ‘A Mão do Diabo’ é mais um exemplo desses filmes pouco revisitados e que merecem uma atenção a mais.     


NOTA: 7,5