Estreias

terça-feira, 30 de outubro de 2018

Crítica - 'Halloween (2018)'


    John Carpenter, nome fundamental da Era de Ouro do subgênero slasher na década de 70 surpreendeu a todos com ‘Halloween (1978)’. Após o inesperado sucesso e a principal referência de sua escola cinematográfica, muitas outras produções seguiram esse mesmo caminho, mas não obtiveram o tamanho êxito. Eis que quarenta anos depois, ‘Halloween (2018)’ retoma a grandiosidade e o primor do clássico.   

 Continuação direta do clássico de 1978, ‘Halloween’ apresenta dois jornalistas interessados em documentar a história de Michael Myers, encarcerado há quatro décadas e com data marcada para transferência de uma instituição psiquiátrica. Porém, nem tudo sai conforme o esperado e resta a Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) enfrentar seu algoz mascarado. 

   A direção assinada por David Gordon Green (dos bons ‘O Que Te Faz Mais Forte’ e ’Joe’) retoma a atmosfera setentista do primeiro filme e traz à tona pequenas referências. Porém, o cineasta imprime sua própria identidade utilizando a seu favor a modernidade oferecida nos dias atuais pelo proveito de recursos técnicos capazes de colocar o público roendo as unhas até o final da produção.              

   Motivos para tais aflições e angústias esta na maneira de como Green retrata as vítimas e suas respectivas mortes. A câmera muitas vezes subjetiva, o plano-sequência e os planos estáticos contemplam a violência em tela criando um maior grau de urgência em cima da figura de Michael Myers. Outro fator da tamanha tensão está no breve desenvolvimento das vitimas tornando as mortes mais sentidas pelo espectador. 

   Dessa maneira, ‘Halloween’ consegue ser autêntico e surpreendente mesmo sendo conhecido por grande parte do público. Não há originalidade nas mortes, na estrutura narrativa ou nas reviravoltas. Mas a presença de Michael Myers é mais intensa e mordaz, as mortes são angustiantes, a relação familiar consonando as três gerações é convidativa ao postar uma atriz veterana no centro das ações, e a trilha sonora é um deleite aos ouvidos do público comprovando o porquê é uma das melhores da história do cinema.           

   Entretanto, nem tudo em ‘Halloween’ é perfeito. O roteiro também assinado por Gordon Green em parceria com Danny Bride se perde em meio a seus personagens secundários, principalmente com as motivações dispensáveis do Dr. Sartain. Por sorte a trama não desvia seu foco com as ações do personagem (não dita para evitar spoiler) e retoma a sua verdadeira essência.     

   Diante de um gênero tão escasso nos dias atuais, ‘Halloween’ novamente surpreende não pela sua originalidade, mas sim em transformar o velho no novo e o clichê no inédito.          
   

NOTA: 8,2

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Crítica - 'Aterrados (Terrified)'


    É bem verdade que o cinema argentino nunca foi reconhecido pelo gênero do terror. Com inúmeras produções de tirar o chapéu e com o devido prestígio ao redor do mundo, o horror em tempo algum foi a grande força nas terras dos los hermanos. E, infelizmente, ‘Aterrados’ é mais uma prova.       

    Quando estranhos eventos acontecem em uma periferia de Buenos Aires, uma doutora especializada em eventos paranormais conta com a ajuda de seu colega de trabalho e um ex-policial para investigar os mistérios que assombram a vizinhança.

   A direção assinada pelo desconhecido Demián Rugna não apresenta um total controle pela sua interessante premissa e se perde nas convenções do gênero. Com um bom primeiro ato prendendo a atenção do espectador com o horror sobrenatural e os mistérios que cerca a vizinhança, remetendo a filmes como ‘Atividade Paranormal’ e ‘Invocação do Mal’. ‘Aterrados’ perde sua subjetividade inicial para conceder respostas rápidas e triviais. 

   Neste seu projeto, Rugna passa a sensação de ainda estar conhecendo o gênero com pouco material em mãos. Por isso o orçamento baixo e recursos técnicos econômicos, a fotografia escura, a iluminação praticamente inexistente postando sempre os personagens em completa escuridão abstém o senso de ameaça e prejudica o tom da narrativa. Conseqüentemente, os últimos eventos são avulsos e pouco relevantes para concluir a trama. 

   Com boas cenas assustadoras e intrigantes no primeiro ato, Rugna não consegue sustentar a curiosidade do público e torna ‘Aterrados’ esquecível.      


NOTA: 5,9

  

terça-feira, 16 de outubro de 2018

Crítica - 'No Coração da Escuridão (First Reformed)'


  O encontro da religião frente às doutrinas filosóficas traz discussões complexas sobre o viver à base de razões e contradições. A partir dessas intrínsecas questões, o cineasta Paul Schrader imerge friamente na luta interna de um reverendo para trazer à tona os dilemas da fé católica mediante a inquietude da transformada progressiva cultural, em seu intricado ‘No Coração da Escuridão’.                      

    A trama acompanha o reverendo Toller (Ethan Hawke) em uma pequena congregação em Nova Iorque lutando com o crescente desespero causado por tragédias, preocupações mundanas e o seu atormentado passado.              

   O diretor e roteirista Paul Schrader sempre foi um mestre na abordagem de estudo de personagem e, aqui, não é diferente. Conhecido por roteirizar os excelentes ‘Taxi Driver’ e ‘Touro Indomável’, novamente Schrader embarca no mais íntimo psicológico de seu personagem. Para assim, adentrar em temas complexos confrontando a práxis católica, hoje, cada vez sendo esquecidas.    
 
     Nesse contexto, Toller mergulha em um mar de angústias, desolação e ansiedade atendendo aos embates dos princípios primários da fé católica. Conseqüentemente, ele conecta-se ao lado da empatia humana reconhecendo ser um pecador, ciente das preocupações mundanas e alarmantes no dia a dia. Dentre elas, o aquecimento global, o capitalismo, o alcoolismo e ‘No Coração da Escuridão’ frisa essas temáticas com os que dizem ser “cristãos” nos dias de hoje.                             

   Diante de questões poderosas, Schrader retrata os sentimentos mais íntimos sem pressa e com ares temerários. Dessa maneira, o cineasta optou por conceder um ritmo lento a trama utilizando de planos estáticos, com uma diferente milimetragem quase que quadrada e enquadramentos centralizados e muitos close-ups nos diálogos. Tornando assim a trama mais intensa, verdadeira e claustrofóbica perante aos olhares do reverendo.  
 
   Outra forma de representar o estado de espírito do reverendo está em sua cinematografia. Como a privação de uma banda sonora extradiegética, uma fotografia fria, nublada, isenta de cores saturadas e tons quentes. O cenário ora em perfeita ordem quando a conexão e empatia ganham vitalidade, ora bagunçado pelos dilemas enfrentados pelo padre (Ethan Hawke em uma atuação introvertida).                

   Apesar de arrastar certos eventos no segundo ato e sua conclusão não ser tão impactante quanto à trama sugeria. ‘No Coração da Escuridão’ é um verdadeiro estudo de personagem, consegue unir religião e niilismo e propõe reflexões importantes sobre as questões morais do nosso ser e viver.

NOTA: 8,6