Estreias

terça-feira, 26 de junho de 2018

Crítica - 'O Suspeito da Rua Arlington (1999)'



    É curioso ‘O Suspeito Da Rua Arlington’ estar ausente das listas dos melhores filmes de suspense. Um dos grandes motivos de sua ausência está pelo fato de ser pouco reconhecido e revisitado pelo público em geral, assim como não ter sua devida distribuição ao redor do mundo. E agora o Filme Na Mente tem o prazer de comentar uma das grandes obras do gênero.               


   Uma criança ensangüentada, atordoada e andando sem rumo no meio da rua abre a primeira cena de ‘Arlington Road’ (do original). Diante de tal situação, Michael Faraday (Jeff Bridges) leva a pobre criança à emergência, e lá conhece os pais do garoto – Oliver (Tim Robbins) e Cheryl (Joan Cusack). Aos poucos, eles se tornam amigos. Porém, os vizinhos começar a agir diferente, chamando a atenção e a desconfiança de Faraday. 
   
   A estréia da direção de Mark Pellington (esquecido nos dias atuais) oferece todas as variantes que o gênero tem de melhor. O suspense instaurado a partir da desconfiança de Faraday ganha novas camadas, eventos e revelações, por conseqüência o espectador se vê imerso a trama e simpatiza com o protagonista. O grande motivo para tal imersão vem do ótimo roteiro de Ehren Kruger em apresentar as motivações, os medos, a insegurança, e os mais singelos sentimentos dos personagens.    

   Michael Faraday é professor universitário, traumatizado pela morte de sua esposa, e precisa cuidar de seu pequeno filho Grant (Spencer Clarck) ao lado de sua namorada, Brooke Wolfe (Hope Davis). Enquanto, Oliver é um vizinho como outro qualquer. Mas será mesmo? E nesse contexto, ‘O Suspeito Da Rua Arlington’ envolve o público.           


   O roteiro engenhoso de Kruger nos faz questionar ao longo da produção se o vizinho é mesmo o farsante ou tudo não é apenas uma imaginação de Faraday. Tudo isso é desenvolvido apenas da primeira metade até o momento de sua verdadeira identidade. Diante dessa resolução, a direção de Pellington brilha ao criar um suspense crescente pelo tom de ameaça em cada enquadramento – com uso de plano holandês, contra-plongée/plongée para acentuar/depreciar a imagem de um personagem em tela, e também nas edições pontuais.               
   
  Com o início do segundo ato, o filme fica mais denso, os subtextos apresentados no inicio ganham mais significância ao longo da projeção, passamos a temer pela vida do protagonista e das pessoas que o cercam. Até a chegada do grande final!

   Nesse percalço, o roteiro de Kruger sofre alguns deslizes com certas facilitações narrativas (não dita para evitar spoiler). Assim como a própria direção de Pellington apropriar com cenas de ação convencionais e pouco empolgantes, mas nada que impeça o prosseguimento da narrativa.    

   Outro ponto altíssimo em ‘O Suspeito Da Rua Arlington’ são as espetaculares atuações de Jeff Bridges e Tim Robbins. Sentimos junto com Faraday o seu sentimento de perda, luto, compaixão pela sua nova namorada e seu filho, e a desconfiança com o seu vizinho Oliver - Jeff Bridges entrega uma das melhores atuações de sua carreira (e olha que são inúmeros filmes em seu currículo). 

  Já Tim Robbins oferece um antagonista diferente do habitual, ele não tem uma presença imponente (como visto em outras produções do gênero), fugindo do estereotipo de seu personagem na pele de um homem trabalhador, pai de família, modesto e por vezes intenso na hora certa. 

   Com um final genial, corajoso, revoltante e, acima de tudo, reflexivo diante de um tema tão relevante nos dias atuais, principalmente nas terras americanas. ‘O Suspeito Da Rua Arlington’ merece ter um maior reconhecimento e ser lembrado entre os melhores filmes do gênero suspense.



                      NOTA: 9,6                             

 
 
                       


quinta-feira, 14 de junho de 2018

Crítica - 'Euphoria'


   Nem Alicia Vikander e Eva Green são o suficiente para retrair o marasmo de ‘Euphoria’. Dispondo de uma das melhores atrizes da atualidade e sob a temática do valor da família, compaixão, perda e eutanásia. A desconhecida diretora Lisa Langseth se perde em meio aos seus diversos temas levantados ao longo da produção, e nenhum deles tem sua devida comoção.        

    A trama acompanha o reencontro das irmãs Ines (Alicia Vikander) e Emilie (Eva Green), após anos e anos separadas. Desavisada, Ines e pega de surpresa ao descobrir que sua irmã está com uma doença terminal e abdica de seus afazeres para ficar ao lado dela.

  ‘Euphoria’ relata o relacionamento conturbado de duas irmãs, após ficarem anos afastadas devido a morte da mãe, vivendo sozinhas em suas angústias. Tal encontro poderia render momentos gratificantes, memoráveis, tensos e comoventes. Mas aqui não é o caso. O filme retém de todas esses sentimentos, com eventos repetitivos, diálogos expositivos e falta de química entre suas protagonistas.          

  Embora individualmente Alicia Vikander e Eva Green estejam ótimas em seus respectivos papéis (mérito para apenas uma cena de discussão entre elas), o espectador não acredita na conexão entre as duas. Tudo é muito avulso e expositivo suficiente para denotar as principais características delas (vide no primeiro ato). Como conseqüência, os eventos não têm o impacto necessário a trama e todas as questões levantadas durante a projeção são abordadas superficialmente.  

   A diretora Lisa Langseth não busca ousar nos recursos técnicos apresentando uma fotografia e trilha sonora convencionais, não aproveita o talento de Charlotte Rampling e torna ‘Euphoria’ (poderia até fazer um trocadilho com o título) esquecível.
 

      NOTA: 5,2

terça-feira, 12 de junho de 2018

Crítica - 'Baseado Em Fatos Reais'


   É inegável o talento de Roman Polanski atrás das câmeras. Com um currículo invejável somando ótimos filmes como, ‘O Bebê de Rosemary’, ‘O Pianista’, ‘Chinatown’, ‘Repulsa ao Sexo’ e muitos outros. A expectativa de cada trabalho de sua autoria é altíssima, principalmente quando o diretor imerge no gênero do suspense psicológico que o consagrou. Porém, seu feito está longe de seus clássicos quando assistimos ‘Baseado Em Fatos Reais’.

   Após uma recepção calorosa de seus fãs autografando seus respectivos exemplares, a autora Delphine (Emmanuelle Seigner) estabelece uma amizade com sua admiradora Elle (Eva Green), esta igualmente escritora, mais conhecida como ghost writer em biografias de celebridades. Aos poucos, as duas vão criando um laço afetivo, mas também certa desconfiança por parte de Delphine.     

   Em um gênero tão bem proficiente por um dos grandes nomes do cinema, Polanski mostra-se ausente em grande parte da produção. Isso se torna visível nos dois primeiros atos, enquanto a protagonista aceita a companhia de Elle devido a sua fragilidade emocional e, como conseqüência, o vinculo entre elas é forçado afetado inúmeras vezes por futilidades ostensivas.         


   Em meio a essa relação passamos a questionar todas as decisões tomadas pela protagonista. Não há um senso de coesão na motivação da autora Delphine e o porquê da confiança de sua suposta amiga. Tudo é abordado com tamanho desdenho, desde aos subtextos relacionados a seu ex-marido, as cartas anônimas até a sua amizade com Elle. Muitos desses temas são futuramente esquecidos pela trama, apenas com a pressa de chegar ao seu impactante terceiro ato. 

   A partir daí, Polanski entrega boas seqüências relembrando os seus melhores trabalhos. A trama apresenta elementos de fantasias muito bem arquitetadas pelo diretor, assim como momentos oníricos distintamente fotografados pelo diferentes contrastes de luz e sombra. Assim, acentuando o suspense no ar em meio a seus enquadramentos em planos médios e primeiros planos. 

   Por esses motivos, o espectador não desiste da produção na intenção de saber qual será o final da obra. Bem como, as boas atuações individuais da dupla Emmanuelle Seigner e Eva Green. Porém, a grande reviravolta pode ser prevista muito antes da revelação final e ‘Baseado Em Fatos Reais’ perde todo seu impacto. 


NOTA: 5,6

quinta-feira, 7 de junho de 2018

Crítica - 'Memoir Of A Murderer'


 Elogiar o cinema sul-coreano se tornou algo corriqueiro nos dias atuais. A crescente notoriedade no cenário mundial provém de inúmeras produções de primeira qualidade do país nos últimos anos. Dentre eles, um gênero que sempre se destacou na terra Sul-Coreana é o suspense; e ‘Memoir Of A Murderer’ vem para se juntar a esse seleto grupo.      

  Com um passado misterioso resultando no mal de Alzheimer, Byung-su (Sol Kyung-gu) começa a suspeitar do namorado de sua filha Eun-hee (Kim Seol-Hyun), por ser o verdadeiro serial killer que os policiais locais buscam encontrar, e também o responsável pelo seu estado físico e psicológico.          
 
  A direção assinada por Shin-yeon Won oferece uma narrativa pouco revisitada pelo gênero. A premissa de roteirizar um protagonista com déficit de memória, cujo objetivo está em salvar sua filha das mãos de um psicopata. Não é a obra mais original, mas Shin-yeon reencontra novos elementos entregando uma trama instigante, visceral e surpreendente. 

  Dentre esses elementos, o diretor Shin-yeon não se prende apenas a um gênero e encontra o equilíbrio perfeito para o suspense, a ação e o drama. ‘Memoir Of A Murderer’ é um estudo de personagem, acompanhando as conseqüências do passado obscuro do protagonista. Em conseqüência, o foco está na sua luta em lidar com suas limitações e na relação entre sua filha - este algo raro de se ver em filmes de mesmo feitio. 

  A partir desses momentos, o filme imerge para a ação e o conflito entre Byung-su e o namorado de sua filha, Tae-ju (Nam-gil Kim), ganha novos contornos. Com o roteiro não linear acompanhando a visão do protagonista (por hora em narrativa em off), ‘Memoir Of A Murderer’ faz questão do espectador perder a empatia por Byung-su, mostrando também seu lado nefasto. Tornando assim o confronto final em aberto, valendo-se pelo ótimo trabalho de decupagem afligindo o público. 

  Mas se o protagonista é rico em suas motivações, convicções e características, não podemos dizer o mesmo do vilão. Tae-ju é unidemensinal, não tem qualquer desenvolvimento e o ator Nam-gil Kim beira ao caricatural. Em compensação, Sol Kyung-gu carrega o filme apresentando um personagem complexo.   

  É impossível deixar de mencionar que o filme bebe da mesma fonte de ‘Amnésia’ e apresenta certas passagens previsíveis. Mesmo não chegando ao mesmo nível dos recentes suspenses coreanos ‘A Criada’ e ‘O Lamento’, ‘Memoir Of A Murderer’ merece sua atenção.  
 

NOTA: 7,3

terça-feira, 5 de junho de 2018

Crítica - 'Em Pedaços'


   Em um mundo assolado por diferentes ideologias, o ódio vem ganhando proporções violentas em cada canto dos sete continentes. A partir desse preceito, ‘Em Pedaços’ abrange o contexto sociopolítico atual discutindo temas pertinentes e inserindo a esse caos o drama vivenciado pela protagonista – a vencedora do Festival de Cannes, Diane Kruger.

    ‘Aus Dem Nichts’ (do original) acompanha a vida familiar feliz de Katja (Diane Kruger), ao lado seu marido Nuri (Numan Acar) e seu filho Rocco. De origem turca e com um passado obscuro por se envolver em tráfico de drogas, Nuri se recompõe e passa a integrar seu tempo trabalhando como tradutor e cuidando do filho. Porém, um atentando em frente ao seu escritório resulta em sua morte e de seu filho, restando a Katja encontrar o homem por trás dessa ação e lidar com sua perda.  

  A direção assinada por Fatih Akin (conhecido por ‘Contra A Parede’, ‘Do Outro Lado’ e ‘The Cut’) repete o feito de seus trabalhos anteriores ao abordar temas contundentes a respeito  sobre o preconceito social. O argumento contemporâneo de seus dois primeiros filmes dispunha de uma narrativa seriamente impactante e, mesmo ‘Em Pedaços’ não portar desse vigor, tem sua mensagem enfatizada frente à crescente onda de fluxos migratórios nos dias atuais.                  
 

    Também assinando como roteirista, Fatih Akin divide sua nova narrativa em três atos: família, justiça e mar. A partir disso, o roteiro deixa como plano de fundo o contexto sociopolítico para focar exclusivamente no psicológico de sua protagonista. Em conseqüência, a direção de Akin valoriza a atuação de Diane Kruger - utilizando closes pontuais, movimentos sutis de câmera (planos-sequencias e plano holandês) reforçando a urgência do momento e a frustração da atriz, assim como a construção de diálogos por meio de mudança de foco. 

   E nada disso não teria resultado, senão fosse a Espetacular atuação de Diane Kruger. Caro leitor, você leu certo! É espetacular com o E maiúsculo. A atriz carregou o filme e transmitiu todo o seu sofrimento - dor, perda, desespero, tristeza, mas também vemos nela uma mulher guerreira e dividida em seus sentimentos de vingança versus justiça. Injustiçada pelo Oscar 2018, Diane Kruger entregou a melhor atuação de sua carreira.     

   Com um roteiro sem grandes revelações, mas intrínseco ao retratar a injustiça/ vingança e crítico ao racismo da Europa frente à onda de delitos xenofóbicos, ‘Em Pedaços’ é relevante por chamar atenção de um tema preocupante e recorrente no cenário atual. 


NOTA: 8,0