Estreias

segunda-feira, 30 de março de 2020

Crítica - 'O Poço (El Hoyo,2019)'



‘O Poço’ não poderia deixar de estrear no momento mais propício frente ao caos do cenário mundial atual. Em meio a pandemia do COVID-19, o longa-metragem espanhol lançado pela plataforma da Netflix surpreendeu a todos ganhando escalas gigantescas ao redor do mundo, tornando-se o filme mais comentado nos últimos dias. Afinal, sua verdadeira mensagem é o infeliz reflexo da sociedade moderna. 

A trama acompanha Goreng (Ivan Massagué) confinado sob o mecanismo de uma penitenciaria vertical em que os presidiários localizados nos pisos superiores são beneficiados, pois recebem um banquete. Enquanto, os dos pisos inferiores recebem os restos ou nada, restando a eles a luta pela sobrevivência. 

O cineasta espanhol Galder Gaztelu-Urrutia estreia com o pé direito atrás das câmeras ao mesclar o suspense social e a fabula kafkiana diante da natureza humana frente a um sistema corrompido. Sua direção prova como tornar uma obra eficiente mesmo tendo em mãos uma proposta geral simples, beneficiando-se da plataforma como o elemento condutor para as metáforas. Dessa maneira, a ótima premissa é desenvolvida com tamanha precisão no primeiro ato favorecendo a imersão do espectador, a partir dos questionamentos entre Goreng e Trimagasi (Zorion Eguileor) . 

Não só isso, Gaztelu-Urrutia prova de recursos técnicos para aproximar o espectador da densa trama e gerando um forte senso de misterio, seja pelo design de produção minimalista e claustrofóbico ou pelo intrínseco design de som em sons diegéticos como o barulho da plataforma, a queda dos malfeitores, as ranhuras nas paredes e o silencio. Lembrando, ‘O Poço’ sugere cenas desconfortantes, gráficas e uma violência pungente refletindo uma visão cética da condição humana, mesmo com relances de otimismo.          

Porém, o cerne do filme está em seu roteiro alegórico com personagens complexos e temas coniventes com a sociedade moderna. A narrativa moldada no capitalismo desenfreado, no egoísmo, no individualismo, sob o pensar no seu próprio bem estar e o outro que lute contra a solidariedade, a consciência coletiva, a inocência e a esperança. Em meio a essas asserções as metáforas são bem inseridas gerando diferentes interpretações. 

Com uma trama rica em metáforas e com fortes críticas sociais, ‘O Poço’ é um daqueles filmes que vai ficar em nossas mentes após o final dos créditos e se insere em um momento chave no contexto atual nos fazendo refletir sob nossas atitudes.        


NOTA: 8,0

SPOILER

Diante de várias metáforas, as críticas sociais sobre o capitalismo, socialismo, desigualdade, luta de classe, consumismo e o comportamento humano tange apenas as mensagens explícitas. Sabendo que ‘O Poço’ vai muito além disso. Há muitas referências a serem percebidas, entre elas estão os elementos bíblicos citados ao longo do filme.    
Sendo assim, a plataforma é uma forte alegoria a Torre de Babel distanciando o céu do inferno entre 333 andares (2 pessoas em cada cela), ou seja 666 homens no total.  O personagem Goreng é retratado como o próprio Messias. A Imoguiri representa a empatia e Baharat a fé chinesa. Enquanto isso, a alta administração são os regentes desse sistema capitalista.         
A jornada de Goreng é justamente sacrificar por todos e mostrar a esperança, a fim de romper o sistema. Durante esse processo ao lado de Baharat, contemplamos os sete pecados capitais. A soberba (o homem de cabelo grisalho mencionando ser merecedor de estar no piso superior), a ira (os responsáveis pela morte de Miharu), a luxúria (dois sujeitos pelados na piscina), a preguiça (a mulher com travesseiro), a gula (o garoto com síndrome de down), a ganância (o velho que estava com o dinheiro) e a vaidade (o rapaz detentor de um violino). 
Quando ambos chegam ao fundo do poço, nenhum dos personagens conseguem sobreviver. A visão de Goreng ao encontrar uma criança em ótimo estado no último piso não passa de seu subconsciente, pois a enxergava como a esperança, a inocência e o futuro da humanidade. Por fim, o filme termina com a criança sendo levada aos céus, ou melhor, a verdadeira mensagem sendo entregue ao público para fora do poço. Ou seja, cabe a nós espectadores decifrarmos se este recado será efetivo ou não em nosso espirito moral.   





segunda-feira, 23 de março de 2020

Crítica - 'O Homem Invisível'


   Muitos Estúdios resolveram criar seu próprio universo cinematográfico, no intuito de atender os fãs modernizando as obras clássicas do cinema para os dias atuais e visando uma grande quantia nas bilheterias. Nesse contexto, se encontra a Universal Dark responsável por Drácula, Múmia, Monstro do Lago, Fantasma da Ópera, ‘O Homem Invisível (2020)’, este com baixíssimo orçamento se comparado com o fracasso de ‘A Múmia (2017)’. O risco de ser mais um fracasso era tamanha para a Produtora, porém o resultado abriu novas esperanças. 

   Na trama, Cecilia (Elizabeth Moss) traumatizada com seu antigo relacionamento suspeita da morte de seu ex-namorado. Buscando novos ares para seguir em frente, ela passa a ser perseguida pelo abusivo e precisa provar que está sendo vítima por alguém que ninguém pode ver.   

   A direção assinada por Leigh Whannell (conhecido pelo muito bom ‘Upgrade’) constrói a narrativa a partir do suspense gradual brincando com o imagético do espectador se o homem invisível está ou não, presente em cena. O motivo de ninguém acreditar na verdade de Cecilia gera certa desconfiança no espectador sobre se ela está realmente alucinada ou se todos os acontecimentos são de fato reais. Consequentemente, ‘O Homem Invisível’ se torna verdadeiro aos nossos olhos e ganha fortes proporções com o passar do tempo entregando cenas tensas, intensas, arrepiantes e surpreendentes (aplausos para a cena do restaurante). 

   Com uma ótima primeiro metade retratando os traumas da protagonista e a perseguição com o Homem Invisível.  A qualidade da produção não está presente apenas nestes elementos, mas sim servindo-se como uma forte metáfora sobre o relacionamento abusivo e a violência doméstica. E nesse cenário, a atuação de Elisabeth Moss é absurdamente impecável imprimindo a desolação de seu passado, o medo, a raiva e a decepção presente, como também a coragem para seguir em frente. Sem ela ‘O Homem Invisível’ não teria o mesmo resultado. 

  Quando adentramos no último ato, a direção tão bem postada por Whannell perde o controle do tom narrativo ao abdicar do terror psicológico e da tal verossimilhança criada inicialmente, para dar espaço as ações do antagonista. Apesar de soar rápido, o clima de tensão, o ritmo frenético e as surpresas de roteiro garantem uma boa dose de ansiedade e euforia ao público.

  ‘O Homem Invisível (2020)’ é muito mais que uma simples história de terror, afinal o verdadeiro horror é aquelas que passam pelas mãos dos inconsequentes e se sentem obrigadas a permanecer num ambiente que não convém com suas realidades. A forte atuação atriz Elisabeth Moss retrata com tamanha perfeição todo o sofrimento e angustia daquelas que um dia já passaram ou, infelizmente passarão. Não podemos deixá-los impune! E essa forte mensagem garante o melhor filme do gênero no ano e um novo futuro para a Universal Dark.   


NOTA: 8,0
                

sábado, 21 de março de 2020

TOP 10 Melhores Filmes de 2019


   O ano de 2019 reservou produções de alto nível e, quiça o melhor ano da década para o cinema. Como de praxe o 'Filme Na Mente' resolveu listar os dez melhores filmes e recordamos para quem ainda não nos conhece, foram avaliados todos os filmes com lançamentos datados nos Estados Unidos.
   Com um ano repleto de filmes de alta qualidade em diferentes nacionalidades não podemos deixar de fora os que merecem nossa menção honrosa e vale reforçar que todos (ou quase) os mencionados estão linkados diretamente para a crítica!
    Deixe nos comentários qual o seu top 10 e qual filme ficou de fora de nossa lista!

    Sem mais delongas, vamos a eles:


10º 

JOJO RABBIT

O cineasta Taika Waititi realiza algo que poucos conseguem, criar o humor frente ao caos. Ambientado na 2º Guerra Mundial e trazendo as telas o homem mais emblemático da história mundial, 'Jojo Rabbit' conquista o público por ser irreverente, por arrancar gargalhadas  e por nos entrega uma belíssima e tocante mensagem em respeito ao próximo independente de sua etnia. 




MIDSOMMAR

O cineasta Ari Aster deixou seu cartão de visita ao apresentar-se no mundo do cinema seu excelente e controverso ‘Hereditário (2018)’. Seu nome passou a figurar entre as grandes promessas no gênero terror e gerou fortes expectativas tanto pelos críticos, quanto pelo público a espera de seu novo projeto. Eis que o diretor não demorou muito para dar as caras e novamente volta a perturbar, refletir o público e gerar discussões em ‘Midssomar – O Mal Não Espera a Noite’. 



HISTÓRIA DE UM CASAMENTO

 Logo no inicio, o cineasta Noah Baumbach prova de sua genialidade criando uma atmosfera afetuosa e reconfortante para o público ao apresentar o casal a partir de uma carta, a poesia em palavras. É questão de segundos para nós simpatizarmos com Charlie e Nicole que, logo em seguida, estão em processo de se separar. Infelizmente, estamos diante de uma história que chegou ao fim onde os detalhes são desfeitos de seus valores pretéritos, os costumes cobertos por ventos e a ruptura de emoções dolorosas e carregada de muitas verdades.   






ERA UMA VEZ EM... HOLLYWOOD

 Era uma vez... Tarantino! Somado em seu currículo nove invejáveis filmes e porventura seu penúltimo. O cineasta conquistou uma legião de fãs ao criar sua própria identidade cinematográfica gerando para si uma grande expectativa entorno de suas produções. Felizmente, Quentin Tarantino nunca decepcionou e dessa vez, apresenta seu projeto mais maduro em ‘Era uma Vez em... Hollywood’.




6º  

BACURAU

Bacurau, um tapa na cara da sociedade brasileira. Em tempos onde se tornou corriqueiro os brasileiros recusarem assistir o próprio cinema nacional em detrimento do ávido consumo exterior, nunca teve tanto significado como nesta nova produção do cineasta Kleber Mendonça Filho (‘Aquarius’).  Afinal, sua mensagem aqui não reflete apenas em nosso cinema, mas sim o quão preocupante o povo brasileiro olha com desprezo à própria cultura.   





RETRATO DE UMA JOVEM EM CHAMAS



O cinema francês e sua delicadeza em entregar o amor genuíno frente a temas controversos nos dias atuais. Sob o olhar poético do artista e sua musa,  sob a projeção de sentimentos em forma de cada pincelada minuciosa, sob a arte como instrumento de refugio e memória efetiva e por fim a convenção artística tradicional como fonte de lembranças da arte intima.  'Retrato de Uma Jovem Em Chamas' é uma obra sensível, delicada, verdadeira, inteligente e de uma forte relevância social.  





CORINGA

As severas críticas implicadas nas últimas produções da DC criou certo receio sobre a futura trajetória de seu Universo no mundo cinematográfico.  Sem grandes exibições e sem aquele frenesi pelos fãs, muito se discutia a qualidade, a visibilidade, a bilheteria e até mesmo a rivalidade com seu concorrente. Entretanto, quando a Estúdio resolve acertar o resultado é uma verdadeira obra-prima e o mesmo se aplica em ‘Coringa (2019)’. 





O FAROL



Original, único, difícil, metafórico e para além da compreensão. O controverso 'O Farol' é um daqueles filmes que não procura dar respostas para o espectador, mas sim nos fazer questionar sua mensagem após o final dos créditos e dificilmente sai de nossas mentes.  [...] Contando com uma das melhores atuações masculinas de 2019  interpretada por Willem Dafoe e a forte linguagem cinematográfica do cineasta Robert Eggers, 'O Farol' é certamente um dos melhores filmes do ano.





PARASITA

Nesse jogo de contraposição diferindo de imagens alegóricas no retrato das duas diferentes classes e gerando reflexões sobre aqueles que culpam um sistema sem olhar o próprio umbigo. ‘Parasita’ é original, sarcástico, tenso, surpreendente, metafórico, denuncia a desigualdade social endêmica dos dias atuais e Joon Ho entrega o melhor do filme de sua carreira ao lado de ‘Memórias de um Assassino’.







O IRLANDÊS

Aqui, Martin Scorsese confronta seu próprio estilo narrativo e entrega algo inovador para o gênero da Máfia. Antes a violência, a glamorização do sistema e a ostentação eram apreciadas em suas obras retratando o encanto no mundo do crime. ‘O Irlandes’ se opõe a esses elementos trazendo a dinâmica dos personagens (parcerias, intrigas e ameaças), a violência testemunhada e, consequentemente, reforça os diálogos poderosos e até mesmo as frases não ditas.   



MENÇÃO HONROSA: