Estreias

segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Crítica - 'Colette'


  Os filmes de época se tornaram a marca registrada da filmografia de Keira Knigtley. Conhecida pelos seus papeis nos ótimos ‘Orgulho e Preconceito’, ‘Desejo e Reparação’, do bom ‘Anna Karenina’, entre muitas outras produções envoltas de séculos passados. A atriz agora respira os ares da Belle Epoque e entrega uma de suas melhores atuações da carreira em ‘Colette’.                            

    A trama retrata o momento mais impactante da vida de uma das maiores escritoras e romancistas francesas de todos os tempos, Sidonie-Gabrielle Colette. Focando no inicio da carreira da futura autora (Keira Knightley), acompanhamos as suas raízes camponesas e seu casamento com Willy (Dominic West), autor renomado em Paris que ganha seu montante publicando o trabalho de outros em seu nome.  

   A direção e uma parcela do roteiro assinado por Wash Westmoreland mantém a estrutura formulaica de cinebiografias, mas oferece a obra um desenvolvimento procedente e sólido para Colette. Focando exclusivamente na força de sua protagonista e o poder de sua voz perante a uma sociedade regado por comportamentos machistas. O roteiro explora com perfeição os nuances da personagem passando de uma jovem ingênua do campo a uma mulher forte, independente e com ideias progressistas a frente de seu tempo, como também para os padrões atuais.    

  Porém, nada disso teria êxito senão fosse à atuação impecável de Keira Knightley. A evolução de sua personagem é o cerne de ‘Colette’, e a atriz passa por um turbilhão de emoções durante seu relacionamento abusivo e nas objeções, Knightley rende as melhores cenas do filme. Quem também convence é Dominic West na pele de um marido provocativo, machista e que no fundo reconhece sua dependência no talento da esposa.  

  Essa tal dependência é metaforizado inteligentemente por Westmoreland durante certas passagens da trama e também sugere o melhor de Colette pelas atitudes grosseiras do marido. Sem Willy, as obras não existiriam. Mas com Willy, a protagonista cresce e o cineasta soube dualizar tais preceitos e emoções. 

  Valorizando a literatura francesa e sua grande expoente no final de século XIX, ‘Colette’ expõe as dificuldades das mulheres em um período proeminente machista e incentiva as mesmas a expressar suas comoções nos dias atuais.    

NOTA: 7,5

domingo, 30 de dezembro de 2018

Crítica - 'Traffik - Liberdade Roubada'



   Poucas produções embarcam na temática do tráfico de pessoas com contundência e verossimilhança. A ideia do realizador Deon Taylor ao abordar o assunto nas telas do cinema, poderia render grandes reflexões e servir como plataforma para possíveis denúncias, porém seu ‘Traffik – Liberdade Roubada’ está bem longe disso.

    A trama acompanha a chegada dos futuros noivos Brea (Paula Patton) e John (Omar Epps) a uma belíssima casa no alto das montanhas. Porém, os pequenos contratempos durante a viagem envolvendo uma gangue de motoqueiros, ganham maior distinção quando eles batem na porta do romântico casal.

   A direção e o roteiro assinado pelo desconhecido Deon Taylor não tem controle sob as diferentes vertentes de sua narrativa.  Seguindo uma estrutura familiar ao excelente ‘Corra (2017)’, somos introduzidos a relação de John e Brea e as desavenças surgidas durante a viagem. Há uma boa construção do suspense em cima do casal principal, porém não é sustentando devido a presença dos personagens secundários desprovidos de personalidade, de diálogos inteligentes, além de tomar decisões questionáveis e mal interpretadas pelos coadjuvantes Laz Alonso e Roselyn Sanchez. 

    Quando o filme concentra-se no suspense em cima do casal, é possível se divertir pelo bom ritmo e pelo clima de angústia. Conseqüentemente, ‘Traffik – Liberdade Roubada’ caminha mais para uma produção de superação e redenção de um herói, quando na verdade estamos diante de uma história sobre o tráfico de escravas sexuais. Tal questão é colocada em segundo plano e não traz o impacto necessário para tornar a experiência num filme denúncia.  

     Com a câmera sempre posicionada valorizando suas belas curvas, Paula Patton convence na pele da corajosa Brea. Mesmo com pouco material, Omar Epps (o Foreman da série ‘House’) é operante. E os vilões, que poderiam acrescentar tanto à trama, se resumem em ser somente práticos. Perdendo uma grande oportunidade de trazer uma relevante mensagem para os dias atuais, ‘Traffik – Liberdade Roubada’ passa uma ideia , mas na verdade apresenta outra.


NOTA: 5,0

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Crítica - 'Crônicas de Natal'


    Com o final de ano se aproximando, nada mais justo a Netflix espalhar o espírito natalino em ‘Crônicas de Natal’. Frequentemente, muitas produções natalinas são lançadas no mês de dezembro todos os anos, no intuito de divertir a criançada e realçar suas mais singelas mensagens. Porém, muito delas partem de uma mesma premissa sem buscar inovar e se tornam mais da mesma e, felizmente, isso não acontece no novo filme da plataforma.  

   Qual criança nunca sonhou em flagrar o Papai Noel no momento exato das entregas do presente? A partir desse questionamento, a trama acompanha as armadilhas dos irmãos Kate e Teddy Pierce, no intuito de estar frente a frente com São Nicolau, porém a confusão é instaurada quando o plano é executado com sucesso colocando em risco o Natal de todo o planeta.   

  A direção assinada por Clay Kaytis oferece a magia do Natal para toda a família. O que parecia ser mais um drama devido às dificuldades da família Pierce perante a perda do patriarca, a história ganha novos rumos para divertir e emocionar todos os espectadores, principalmente as crianças. Tudo isso começa com a chegada do Papai Noel e  o ótimo trabalho de Kaytis em conciliar o mundo real com o fantasioso, rende ótimas sacadas e torna ‘Crônicas de Natal’ prazeroso.          

  O grande cerne de ‘Crônicas de Natal’ é o seu Papai Noel diferente dos padrões visto pela maioria. Aqui ele não tem aquele barrigão e utiliza o famoso bordão Ho-Ho-Ho, mas o querido Noel é estiloso, despojado, engraçado, amante de um bom blues e por que não anárquico.  E nada mais justo ele ser protagonizado divertidamente por Kurt Russel que carrega não só as sacolas de brinquedo nas costas, como também o filme. Porém, não considere esse comentário negativo, pois também as crianças protagonizadas por Darby Camp e Judah Lewis esbanja simpatia transmitindo os verdadeiros sentimentos do espírito natalino.

    Divertido, despretensioso e valorizando as mais verdadeiras mensagens do espírito natalino, ‘Cronicas de Natal’ é uma boa indicação para juntar toda a família nesta data comemorativa.              
 
NOTA: 6,8
                  

   

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Crítica - 'Roma'


   Mesmo com uma filmografia curta em sua carreira, o cineasta Alfonso Cuarón chega a um patamar absurdo em seu novo projeto, ‘Roma’. Conhecido pelos ótimos ‘Filhos da Esperança’, o terceiro e mais elogiado capitulo da saga ‘Harry Potter’ e ‘Gravidade’, este último responsável pela sua conquista do Oscar de melhor diretor. Dessa vez, Cuarón chega a um nível surpreendente de fazer cinema e carimba de vez seu nome como um dos melhores diretores em atividade.      

   Baseado nas memórias efetiva do cineasta dedicando a obra àquela que fez parte de sua formação, a trama acompanha um ano da vida de uma família no México, em 1970, a partir do ponto de vista da empregada doméstica, Cleo (Yalitza Aparicio). 

    Em ‘Roma’, Alfonso Cuarón entrega o seu filme mais intimo e pessoal da carreira. Com sua direção optando pela cinematografia em 65mm preto e branco limpo e digital, a câmera estática e distante dos personagens movimentando suavemente nas horizontais, em meio tracking shots delicados e tomadas em 360º. Fornece a todos nós a experiência de sermos os fantasmas dessa comovente memória onde contemplamos uma vida regada de anseios, porventura, trivialidades, angústias, motivações e razões.   

  De um realismo assustador, ‘Roma’ proporciona um cinema verdadeiro, puro, genuíno e fascinante.  A excelência técnica de Cuarón é impressionante ostentando a câmera menos intrusiva vista há anos no cinema mundial e, por conseguinte, trazer um realismo as telas capaz de questionarmos se estamos realmente diante de um filme. A condução lenta, a valorização das trivialidades do dia a dia dos personagens, o fabuloso design de som e as conexões de cenas antagônicas em um único enquadramento tornam a obra imersiva e impactante.    
 
  Por essas e outras, o filme nos entrega cenas grandiosas e memoráveis em que cada um de nós irá se identificar com algumas delas. Mesmo que o ritmo lento desagrade alguns, ‘Roma’ é uma obra intimista, verossímil e convidativa as experiências sensoriais, partilhando os sentimentos mais íntimos de sua protagonista, Cleo.    

  Sensível, humano, verdadeiro e tocante, Alfonso Cuarón da uma aula de cinema em ‘Roma’ e nos motiva a olhar a nossa história, sem deixar de lado aqueles que fizeram parte de nossas essências.
 

NOTA: 9,1

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Crítica - 'O Predador'


  Predador (2018)’, a fórmula barata de conquistar o público atual pela sua representatividade cinematográfica. A lista é enorme de seqüências inspiradas nos grandes clássicos do cinema, seja eles mantendo a estrutura de seus precursores ou inovando uma franquia já desgastada. O novo filme da franquia Predador segue esta última vertente, e o resultado pode incomodar os fãs fervorosos do gênero.     

   Após uma nave alienígena cair nos solos do planeta Terra, um capturado predador se torna alvo de pesquisas cientificas liderada pela bióloga Casey Brackett (Olivia Munn). Mas não demora muito para a presa escapar do laboratório, devido às curiosidades do prodígio garoto (Jacob Tremblay) decodificar as linguagens extraterrestres.       

   A direção assinada por Shane Black (dos bons ‘The Nice Guys’ e ‘Beijos e Tiros’) considera os acontecimentos dos clássicos de 1987 e 1990 sugerindo um maior engajamento com os fãs. Porém, não é o suficiente para agradá-los por desconstruir o gênero do terror tão reconhecido da franquia com o destino de abrir espaço à comédia. Como em seus outros trabalhos, Black se mostrara um ótimo cineasta de comédia com seu humor irreverente e infantil, entretanto tais decisões pode não agradar a todos aqui.  
 
   Com o lado humorístico sobressaindo ao terror, ‘Predador’ perde sua essência a ponto de indagarmos se estamos realmente assistindo a seu filme. Porém, para quem não tem nada a perder vai se divertir com boas piadas e boas seqüências de ações muito bem executadas por Black. E em meio a todo o caos, acompanhamos o trio protagonista Casey, Quinn (Boyd Holbrook) e o garoto lado a lado enfrentando os seres extraterrestres.                    

    Mesmo com resoluções simplificadas e facilitações narrativas para dar prosseguimento a trama, 'Predador (1018)'  oferece simplesmente uma boa diversão.         


NOTA: 5,9 

domingo, 16 de dezembro de 2018

Crítica - 'A Morte De Stalin'


   Recentemente, fiz um comentário sobre a escassez de bons filmes de comédia nos dias atuais quando elaborei a crítica de ‘A Noite do Jogo’. No entanto, o ano de 2018 vem surpreendendo os fãs do gênero entregando ótimas produções como ‘O Retorno do Herói’, ‘Sorry To Bother You’, ‘Não Vai Dar’. Porém, nenhum deles tem a originalidade e a inteligência do espetacular ‘A Morte de Stalin’.

     A história se dá após a inesperada morte do ditador Josef Stalin (Adrian Mclouglin) em 1953, na União Soviética, onde o alto escalão do comitê do Partido Comunista procura decidir quem será o sucessor do líder soviético e os rumos do futuro da nação. 

  Há quem se engane e tome a ‘A Morte de Stalin’ como sendo um docudrama, mas não, o filme se trata de uma sátira ao contexto político regido na década de 50 na União Soviética. Diante dos mistérios, mitos e suposições acerca da morte de Stalin, o filme consegue ser hilário e bastante fiel aos fatos estudados, dispondo de personagens também fidedignos. O tom jocoso e autêntico concilia a narrativa com perfeição extraindo ótimas tiradas, como também expondo os horrores do regime totalitário. 

  Dessa maneira, a direção assinada por Armando Iannucci (conhecido pelo ótimo ‘In the Loop’) encontra o equilíbrio perfeito entre o humor e a tragédia. Com a câmera na mão acompanhando os diálogos e as ações/reações de todos os personagens, e reforça o senso de urgência e o humor reativo e reacionário. A própria edição favorece o tom cômico compreendendo o momento certo de cortar uma cena à partir de pequenos gestos causando uma inquietação ao público. 

  Ficamos com o desejo de querer ver um pouco mais, porém nem sempre isso acontece. Por outro lado, as cenas, digamos, “menos legais” (apesar de todas serem de uma qualidade invejável) se prolongam mais do que o necessário não utilizando tal recurso. Entretanto, nada tira o ímpeto de ‘A Morte de Stalin’ e o trabalho ácido, satírico e de um humor negro sem igual de Iannucci. Outro grande mérito de sua direção está na escolha do dialeto puramente americano, ou melhor, sem sotaque russo. Desse modo, todos os personagens apresentam características marcantes, engraçadas e visto como anti-heróis. Pois, todos estão lá apenas para pensar em sua segurança, independente do número de coligações e rivalidades partidárias. Como conseqüência, há uma crítica genial subentendida comprovando a frase 'dê poder ao homem e descubra quem ele realmente é’.

  As interpretações são espetaculares, de todo o elenco, com destaque para o engraçadíssimo Jeffrey Tambor, o dúbio Steve Buscemi e o impiedoso Simon Russell Beale, o  filme ainda conta com Andrea Riseborough, Michael Palin, Adrian Mclouhlin e Paddy Considine, todos excelentes. 

 Diferente de muitas comédias vistas em grande circuito, ‘A Morte de Stalin’ veio para mostrar a força do gênero com inteligência, sarcasmo, diversão e merece ser lembrado nas listas dos melhores filmes de comédia do ano, quiça de todos os tempos.


NOTA: 9,7

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Crítica - 'Na Praia de Chesil'



    O aclamado autor Ian McEwan apresenta no âmago de suas obras literárias, dramas complexos de amor no seio da sociedade britânica.  Foi assim em seu bestseller ‘Expiação’ lançado no cinema em 2007, e agora o escritor adapta o seu próprio romance em forma de argumento para entregar mais uma trama difícil com um subtexto fascinante em ‘Na Praia de Chesil’.

    A trama acompanha o jovem casal Florence (Saoirse Ronan) e Edward (Billy Howle), recém-casados, curtindo a lua-de-mel em um pequeno hotel próximo a praia de Chesil, em Dorset. Porém, à medida que se aproxima a consumação do casamento, as conversas e anseios ganham um grau de tensão e as diferenças ideológicas, cultural e comportamental do casal, coloca em prova o futuro do relacionamento.

   A direção assinada pelo estreante Dominic Cooke apresenta pontos altos e baixos durante sua produção. Apoiando-se nas espetaculares interpretações do elenco central de Ronan e Howle, ‘Na Praia de Chesil’, consegue fisgar a atenção do público não apenas pelas atuações, mas também pela forte empatia e amor do casal contemplado a partir dos flashbacks. Somos situados em diferentes anos, apresentando-nos os personagens em várias idades até o atual presente, antes da consumação do casamento.                                                                                                            



   Entretanto, tais flashbacks não são inseridos de maneira orgânica quebrando o ritmo da trama. Nesse quesito, a direção de Cooke se perde na edição e montagem negligenciando o tom da narrativa. Como conseqüência, a dramática cena à beira da praia de Chesil (excelente por sinal) e suas conseqüências, se tornam afoitas demais em relação aos dois primeiros atos do longa-metragem.

    Por mais intenso e comovente que seja seu último ato, faltou em ‘Na Praia de Chesil’ o peso carregado do casal após a grande objeção. Em contrapartida, tecnicamente, Cooke mostra-se um cineasta comprometido com sua cinematografia. Em meio a diferentes décadas, o design de produção e  a caracterização dos personagens, são um show à parte retratando os anos de 1962, 1975 e 2007.
    
      Apesar de não encontrar o equilíbrio em seu tom narrativo, ‘Na Praia de Chesil’ é um bom filme de romance, ao retratar os dilemas de uma relação nos anos 60, sem perder seu forte tom dramático, provando a devassidão da incomplacência, o peso do remorso e, acima de tudo, o verdadeiro significado do amor.


NOTA: 7,0



sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Crítica - 'Guerra Fria'


   O amor, a guerra e a música atravessam o tempo de mãos atadas em ‘Guerra Fria’. Diferente das convenções narrativas dos romances atuais, a produção polonesa sob o comando do engenhoso cineasta Pawel Pawlikowski (conhecido pelo excelente ‘Ida’ -2013) retoma os ares dos grandes clássicos e presenteia a todos com um romance único, humanista, literato e poético.

 Representando a Polônia no Oscar 2019, 'Zimna Wojna' (do original) acompanha as idas e vindas do casal Zula (Joanna Kulig) e Wiktor (Tomasz Kot), incluindo viagens em diferentes países e separações impossíveis de ter voltas, durante a Guerra Fria entre a Polônia stalinista e a Paris boêmia dos anos 50.

   Seguindo os moldes da cinematografia de seu último projeto em ‘Ida’, o cineasta Pawel Pawlikowski repete o preto e branco, além da proporção 4:3, tornando a película com um aspecto mais quadrado. O resultado é deslumbrante! Transportando o espectador ao clima da década de 50, cada frame é um wallpaper, onde a fotografia invade a tela nos fortes contrastes de luz e sombra concedendo as mais belas imagens das apresentações dos personagens, do casal, dos cenários quase barrocos artisticamente com enquadramentos bem elaborados reforçando a narrativa. 

    
     Motivos do preto e branco e do confinamento de uma tela quase que quadrada, também está diante da odisseia do amor musical enfrentados pelo casal. Wiktor é metódico, sério, quieto, mas se perde aos encantos e talentos daquela que fora um dia sua aluna, a Zula. Esta, jovem e promissora, com um talento descomunal quando sobe nos palcos para cantar, sem contar sua energia positiva e seu espírito independente (na atuação espetacular da atriz Joanna Kulig ofuscando qualquer um em cena). E os dois, apaixonados, devem enfrentar os percalços desse amor ora próximo, ora distante, fazendo maior alusão ao título do filme.

      Dessa maneira, brilha a direção de Pawlikowski ao expressar a conservação dos sentimentos mediante as constantes transformações sociais. Nesse contexto, ‘Guerra Fria’ retrata a guerra pelos efeitos psicológicos nos protagonistas, ao invés da política interna dos países envolvidos. Nessas circunstâncias, estamos diante de sucessivas frustrações efêmeras em uma história feita de meios encontros e de finais, por pouco, felizes. E todos esses fatores são reforçados com a técnica invejável de Pawlikowski. A condução elegante, plástica e soberba pela montagem composta ao ritmado dinamismo com a quietude naturalista, este valorizando as emoções, as imagens e expressões sem pronunciar uma única palavra. Alcançando, assim, os resultados mais expressivos possíveis.       
                       
    Onde a mensagem final surge nas metáforas das mais poéticas frases. “O pendulo matou o tempo...” e “A vista é melhor do outro lado...” Concluímos que já não se faz mais romance como ‘Guerra Fria’ nos dias de hoje. 


NOTA: 10 
  

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Crítica - 'Infiltrado na Klan'


    ‘Inflitrados da Klan’ é tão inusitado a ponto de questionarmos o tempo todo se sua história é realmente real. Partindo-se de um humor irreverente ao suspense policial e o drama com viés político e racial enraíza o tom pouco crível da nova obra do cineasta Spike Lee e desestabiliza a todos os espectadores.        

    Baseado no livro de memórias de Black Klansman, de Ron Stallworth, a trama acompanha o progresso de Ron (John David Washington), primeiro policial negro na Policia de Colorado Springs nos anos 70 a se infiltrar na Ku Klux Klan. Para isso ele conta com a ajuda de seu parceiro de trabalho, o judeu Flip  Zimmerman (Adam Drive) para comparecer as visitas e encontros da Klan.        

    Com Spike Lee no comando, reconhecido por suas cinematografias de temática racial, retorna cobrindo uma das histórias mais fascinantes e completamente inusitadas. Lee não toma conhecimento das prerrogativas de cada um dos lados e logo de cara entrega cenas intensas e verborrágicas em cada discurso. Aqui não há paz e amor, a violência e combatida através da violência e ambos os lados são representados pelas suas fortes concepções e razões. 

   Em meio a toda essa dicotomia, ‘Inflitrados da Klan’ inicia-se de um humor irônico e irreverente a partir das ações e reações dos personagens principais que ganha novas camadas e relevâncias sugerindo fortes criticas ao racismo velado no mundo presente. Spike Lee não poupa momentos satirizando a ignorância da supremacia branca e as idéias racistas, rendendo boas sacadas e reconhecendo a força política atual de sua trama.

   Diante da temática, a direção de Lee toma liberdade em meio a ações para trazer referências de outros filmes discutindo tópicos políticos e culturais da atualidade. Se por um lado rende ótimos momentos – tanto angustiantes quanto cômicos - envolvendo os personagens Ron Stallworth, Flip Zimmerman e (Topher Grace), um por ser negro, o outro judeu e o líder da Klan, respectivamente.  Do outro, trama perde seu ímpeto quando foge da zona dos seus personagens principais para dar espaço a romances pouco interessantes se arrastando mais do que o necessário. 
 
   Em contrapartida, somos contemplados pelas ótimas atuações do trio John David Washington, Adam Drive e Topher Grace. Todos de personalidades fortes, sofrendo pelas suas angustias e ódios corroendo-os por dentro, e com uma forte química capaz de surgir momentos gratificantes e cômicos em meio a toda tensão. 

   Apesar do didatismo e escancarar aos olhos do público a crescente tensão e discurso de ódio apresentando imagens fortes e reais o total descontrole da falta de empatia nos dias atuais, ‘Inflitrados da Klan’ nos faz refletir sobre os pensamentos retrógrados que estão em voga no mundo atualmente e o nosso papel como ser humano dentro de uma sociedade. 


NOTA: 8,3
                                        

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Crítica - 'Buscando...'


    As redes sociais estão cada vez mais presentes nas produções da indústria cinematográfica.  Tal temática vem ganhando tamanha relevância nos dias atuais e sugerem inúmeras reflexões a partir das versatilidades dos longas-metragens. Foi assim com ‘Amizade Desfeita’, o recente ‘Oitava Série’ e agora ‘Buscando...’.  

 Após uma adolescente de dezesseis anos desaparecer e as investigações policiais não levarem a rumo algum, seu pai David Kim (John Cho) resolve por conta própria descobrir o paradeiro da filha com o auxílio do notebook da menina para busca de pistas.   

  A estréia na direção de Aneesh Chaganty não poderia ser melhor. Relatando através de registros tecnológicos, o cineasta buscou diferentes maneiras para construir a narrativa por meio de ações do protagonista com o uso do notebook e seus aplicativos. Dessa maneira, as diferentes redes sociais envolto no mundo adolescente ganham grande relevância à trama e sugere fortes críticas a sociedade atual.  

   A câmera subjetiva nos coloca na pele do protagonista e acompanhamos cada clique dele à procura de pistas. Tal circunstância reforça a empatia do público com o pai Kim e sentimos junto com ele a sua preocupação, aflição, zelo e amor pela sua filha desaparecida. Conseqüentemente, para um pai, chega a ser impactante encontrar as subversões de sua filha nas redes sociais e passar a duvidá-la de sua real essência. 

   Outra grande questão abordada em ‘Buscando...’ está diante do comportamento digital presente hoje em dia. As pessoas são tóxicas, mentirosas, falsas e hipócritas e o filme faz questão de salientar esse tema trazendo a melhor crítica à cultura da internet no cinema. 

   A parte investigativa também é super envolvente. O diretor Chaganty criou uma atmosfera inquietante, apreensiva e alarmante utilizando perfeitamente a montagem para ditar o ritmo do filme, ora trazendo momentos de tensão, ora de alivio. E, em meio a esses nuances narrativos, John Cho transmite todos esses sentimentos em tela e ficamos sempre a sua torcida.         

    Trazendo uma nova forma de construir o suspense com intermédio das tecnologias vigentes no mundo adolescente, ‘Buscando...’ trata com seriedade a cultura da internet dos dias atuais, empolga o público com sua tensão crescente e coloca no radar o estreante cineasta Aneesh Chaganty.


                       NOTA: 8,3                       

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Crítica - 'O Protetor 2'


  Vem se notabilizando inúmeras franquias de filmes de ação nos últimos anos. Podemos facilmente mencionar, ‘Jason Bourne’, ‘Mission Impossible’, ‘Taken’ ‘John Wick’, ‘Equalizer’, e todos eles sempre com o mesmo propósito colocar no centro das ações um astro e empolgar o público com as mais variantes seqüências de ação. Porém nem todas as franquias repetem ou superam o brilhantismo do primeiro filme e, infelizmente, acontece em ‘O Protetor 2’.    

    Trabalhando agora como motorista, Robert McCall (Denzel Washington) passa seus dias ajudando àqueles que enfrentam dificuldades decorrentes de injustiças. Porém quando a morte de sua amiga Susan Plumer (Mellisa Leo) é noticiada, ele resolve voltar à ativa, no intuito de encontrar os transgressores do crime.

    A direção assinada novamente por Antoine Fuqua evoca o melhor de seu apuro técnico. Com menos momentos de ação em relação ao primeiro filme, o cineasta recicla algumas de suas idéias do precursor e apresenta um vasto material para coordenar tais seqüências utilizando tracking shots invertidos, transição de planos abertos para os detalhes, o uso da câmera lenta e a desaceleração do tempo. Como conseqüência, ‘O Protetor 2’ empolga os amantes do gênero e as batalhas, em especial no ultimo ato, se tornam mais objetivas. 

   Entretanto, o roteiro carece de boas idéias em suas subtramas e de um vilão à altura de ‘Protetor 1’. O primeiro ato é marcado por muitas idas e vindas da trama central com os sub arcos (uma dispensável envolvendo o ator Orson Bean) e demora para ‘O Protetor 2’ dar finalmente sua cara. Quando a trama resolve focar exclusivamente em seu personagem principal, a ação toma conta da produção e Denzel Washington prova o porquê é um ótimo ator.      

   Mesmo genérico, ‘O Protetor 2’ tem tudo para agradar os fãs dos gênero e daqueles que gostaram de seu precursor.              
 

NOTA: 6,5
                                   
 
               

terça-feira, 13 de novembro de 2018

Crítica - 'Missão Impossível: Efeito Fallout'


    Quando tudo parecia desgastado na franquia, ‘Missão Impossível – Efeito Fallout’ prova o contrário. Mantendo o mesmo diretor de seu antecessor ‘Nação Secreta’, Christopher McQuarrie entrega o seu melhor projeto da carreira e coloca seu nome como grandes promessas do cinema de ação.      

    Após o fracasso de uma missão resultando no sumiço do plutônio, Ethan Hunt (Tom Cruise) e sua equipe da IMF são forçados a se aliar a um persistente agente da CIA (Henry Cavill) para salvar a civilização das mãos de agentes qualificados detentores de armas nucleares.                            

    Não demora muito para a ação tomar conta da produção e ‘Efeito Fallout’ provar que o gênero ainda tem muito a oferecer. A direção de McQuarrie apresenta uma enorme variedade de planos e entrega as melhores seqüência de ação, porradas e perseguições da franquia. O uso de tomadas aéreas, tomadas baixas, ângulos agudos e planos abertos valorizam a intensidade de cada cena e as belíssimas locações de Paris, Londres e da região de Caxemira.      

   Porém, não apenas de ação ‘Efeito Fallout’ se sustenta. Aqui, McQuarrie flerta com o suspense a partir das motivações subentendidas dos personagens secundários e com o proveito da trilha sonora realçando tais mistérios. Como conseqüência, a ação e o suspense encontram o equilíbrio perfeito a trama mantendo o espectador com os olhos grudados na tela até o final de sua projeção.
 
   Em termos de roteiro, o filme segue os mesmos estereótipos narrativos de outros da franquia. Sem aquela predileção inovadora e personagens multifacetados, Tom Cruise continua sendo o mesmo Tom Cruise de sempre, o vilão não tem personalidade e a equipe de Ethan Hunt conquista o público pela suas respectivas simpatias. O filme ainda conta com as boas presenças de Henry Cavill e Rebecca Ferguson.

   Mesmo exagerando em suas reviravoltas, ‘Missão Impossível – Efeito Fallout’ comprova que a franquia ainda tem muito a oferecer e se destaca aos demais presenteando o público com as melhores seqüências de ação. 


 NOTA: 8,5


           

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Crítica - 'Megatubarão'


    O histórico filme de tubarão no cinema conquistou legiões de fãs ao redor do mundo. Tudo começou com o espetacular ‘Tubarão (1975)’ de Spielberg e, de lá para cá, muitos blockbuster moderno intimamente ligado com esse tema preza mais pela diversão escapista do que propriamente o suspense. E a nova produção da Warner, ‘Megatubarão’ rema a favor dessa maré.          

    A trama acompanha uma estação submarina de pesquisas cientificas posta a descobrir os mistérios das águas profundas. Porém, quando parte de sua equipe é atacada por uma criatura misteriosa, o mergulhador especializado em resgate, Jonas Taylor, (Jason Statham) é convocado para salvá-los.     

   O diretor Jon Turteltaub, conhecido por ‘A Lenda do Tesouro Perdido’ e ‘Ultima Viagem a Vegas’, sabe entregar estórias divertidas frente a roteiros bobos.  ‘Megatubarão’ reconhece sua abordagem jocosa e convida o público a aceita-lá frente às convenções do gênero mesclando a comédia do absurdo, o cômico e até mesmo o assustador. Conseqüentemente, os diálogos tolos, as frases de efeito e os personagens mais unidimensionais possíveis abrem espaço para a diversão garantida.      

   Com seqüências de ações bem executadas, Turteltaub varia diferentes tomadas para realçar a grandeza do Megalodon e o caos generalizado. As cenas subaquáticas, a câmera área  e o CGI ora surpreendente, ora artificiais garantem a diversão na pele do herói genérico na atuação de Jason Statham.  

    ‘Megatubarão’ é mais um desses filmes pipoca que garante uma boa diversão e entretenimento a todos.  


NOTA: 6,7
 
     

terça-feira, 30 de outubro de 2018

Crítica - 'Halloween (2018)'


    John Carpenter, nome fundamental da Era de Ouro do subgênero slasher na década de 70 surpreendeu a todos com ‘Halloween (1978)’. Após o inesperado sucesso e a principal referência de sua escola cinematográfica, muitas outras produções seguiram esse mesmo caminho, mas não obtiveram o tamanho êxito. Eis que quarenta anos depois, ‘Halloween (2018)’ retoma a grandiosidade e o primor do clássico.   

 Continuação direta do clássico de 1978, ‘Halloween’ apresenta dois jornalistas interessados em documentar a história de Michael Myers, encarcerado há quatro décadas e com data marcada para transferência de uma instituição psiquiátrica. Porém, nem tudo sai conforme o esperado e resta a Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) enfrentar seu algoz mascarado. 

   A direção assinada por David Gordon Green (dos bons ‘O Que Te Faz Mais Forte’ e ’Joe’) retoma a atmosfera setentista do primeiro filme e traz à tona pequenas referências. Porém, o cineasta imprime sua própria identidade utilizando a seu favor a modernidade oferecida nos dias atuais pelo proveito de recursos técnicos capazes de colocar o público roendo as unhas até o final da produção.              

   Motivos para tais aflições e angústias esta na maneira de como Green retrata as vítimas e suas respectivas mortes. A câmera muitas vezes subjetiva, o plano-sequência e os planos estáticos contemplam a violência em tela criando um maior grau de urgência em cima da figura de Michael Myers. Outro fator da tamanha tensão está no breve desenvolvimento das vitimas tornando as mortes mais sentidas pelo espectador. 

   Dessa maneira, ‘Halloween’ consegue ser autêntico e surpreendente mesmo sendo conhecido por grande parte do público. Não há originalidade nas mortes, na estrutura narrativa ou nas reviravoltas. Mas a presença de Michael Myers é mais intensa e mordaz, as mortes são angustiantes, a relação familiar consonando as três gerações é convidativa ao postar uma atriz veterana no centro das ações, e a trilha sonora é um deleite aos ouvidos do público comprovando o porquê é uma das melhores da história do cinema.           

   Entretanto, nem tudo em ‘Halloween’ é perfeito. O roteiro também assinado por Gordon Green em parceria com Danny Bride se perde em meio a seus personagens secundários, principalmente com as motivações dispensáveis do Dr. Sartain. Por sorte a trama não desvia seu foco com as ações do personagem (não dita para evitar spoiler) e retoma a sua verdadeira essência.     

   Diante de um gênero tão escasso nos dias atuais, ‘Halloween’ novamente surpreende não pela sua originalidade, mas sim em transformar o velho no novo e o clichê no inédito.          
   

NOTA: 8,2

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Crítica - 'Aterrados (Terrified)'


    É bem verdade que o cinema argentino nunca foi reconhecido pelo gênero do terror. Com inúmeras produções de tirar o chapéu e com o devido prestígio ao redor do mundo, o horror em tempo algum foi a grande força nas terras dos los hermanos. E, infelizmente, ‘Aterrados’ é mais uma prova.       

    Quando estranhos eventos acontecem em uma periferia de Buenos Aires, uma doutora especializada em eventos paranormais conta com a ajuda de seu colega de trabalho e um ex-policial para investigar os mistérios que assombram a vizinhança.

   A direção assinada pelo desconhecido Demián Rugna não apresenta um total controle pela sua interessante premissa e se perde nas convenções do gênero. Com um bom primeiro ato prendendo a atenção do espectador com o horror sobrenatural e os mistérios que cerca a vizinhança, remetendo a filmes como ‘Atividade Paranormal’ e ‘Invocação do Mal’. ‘Aterrados’ perde sua subjetividade inicial para conceder respostas rápidas e triviais. 

   Neste seu projeto, Rugna passa a sensação de ainda estar conhecendo o gênero com pouco material em mãos. Por isso o orçamento baixo e recursos técnicos econômicos, a fotografia escura, a iluminação praticamente inexistente postando sempre os personagens em completa escuridão abstém o senso de ameaça e prejudica o tom da narrativa. Conseqüentemente, os últimos eventos são avulsos e pouco relevantes para concluir a trama. 

   Com boas cenas assustadoras e intrigantes no primeiro ato, Rugna não consegue sustentar a curiosidade do público e torna ‘Aterrados’ esquecível.      


NOTA: 5,9

  

terça-feira, 16 de outubro de 2018

Crítica - 'No Coração da Escuridão (First Reformed)'


  O encontro da religião frente às doutrinas filosóficas traz discussões complexas sobre o viver à base de razões e contradições. A partir dessas intrínsecas questões, o cineasta Paul Schrader imerge friamente na luta interna de um reverendo para trazer à tona os dilemas da fé católica mediante a inquietude da transformada progressiva cultural, em seu intricado ‘No Coração da Escuridão’.                      

    A trama acompanha o reverendo Toller (Ethan Hawke) em uma pequena congregação em Nova Iorque lutando com o crescente desespero causado por tragédias, preocupações mundanas e o seu atormentado passado.              

   O diretor e roteirista Paul Schrader sempre foi um mestre na abordagem de estudo de personagem e, aqui, não é diferente. Conhecido por roteirizar os excelentes ‘Taxi Driver’ e ‘Touro Indomável’, novamente Schrader embarca no mais íntimo psicológico de seu personagem. Para assim, adentrar em temas complexos confrontando a práxis católica, hoje, cada vez sendo esquecidas.    
 
     Nesse contexto, Toller mergulha em um mar de angústias, desolação e ansiedade atendendo aos embates dos princípios primários da fé católica. Conseqüentemente, ele conecta-se ao lado da empatia humana reconhecendo ser um pecador, ciente das preocupações mundanas e alarmantes no dia a dia. Dentre elas, o aquecimento global, o capitalismo, o alcoolismo e ‘No Coração da Escuridão’ frisa essas temáticas com os que dizem ser “cristãos” nos dias de hoje.                             

   Diante de questões poderosas, Schrader retrata os sentimentos mais íntimos sem pressa e com ares temerários. Dessa maneira, o cineasta optou por conceder um ritmo lento a trama utilizando de planos estáticos, com uma diferente milimetragem quase que quadrada e enquadramentos centralizados e muitos close-ups nos diálogos. Tornando assim a trama mais intensa, verdadeira e claustrofóbica perante aos olhares do reverendo.  
 
   Outra forma de representar o estado de espírito do reverendo está em sua cinematografia. Como a privação de uma banda sonora extradiegética, uma fotografia fria, nublada, isenta de cores saturadas e tons quentes. O cenário ora em perfeita ordem quando a conexão e empatia ganham vitalidade, ora bagunçado pelos dilemas enfrentados pelo padre (Ethan Hawke em uma atuação introvertida).                

   Apesar de arrastar certos eventos no segundo ato e sua conclusão não ser tão impactante quanto à trama sugeria. ‘No Coração da Escuridão’ é um verdadeiro estudo de personagem, consegue unir religião e niilismo e propõe reflexões importantes sobre as questões morais do nosso ser e viver.

NOTA: 8,6



quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Crítica - 'The Tale (O Conto,2018)'


   Um dos grandes objetivos da sétima arte é valorizar sua mensagem frente aos dilemas da sociedade atual. Poucos filmes conseguem abordar temas impactantes e condecorar futuras reflexões e discussões sobre o assunto. E quando entra em questão o abuso sexual infantil, pouquíssimas produções retratam sua realidade tão nua e crua quanto ‘O Conto’. 

   Baseado nas tristes experiências pessoais da diretora Jennifer Fox, a trama acompanha Jennifer (Laura Dern) revisitando e confrontando seus traumas de quarenta anos atrás, após sua mãe descobrir sua história a respeito de seu relacionamento especial com os dois treinadores adultos de um acampamento.          

   Não estamos diante de uma obra fictícia, mas sim de uma triste realidade. Contemplar o crescente evento narrativo e suas conseqüências geradas mesmo após muitos anos provoca um misto de sentimentos ao espectador trazendo à tona uma recensão de indignação e emoção. O valor temático é tão rico que não estamos lidando apenas com o abuso, mas principalmente o disfarce da memória moldada a nos fazer seguir adiante.        

   Não obstante, a direção assinada por Jennifer Fox retrata com maestria todos os diferentes tópicos de sua produção. Estamos diante de um olhar difícil, ríspido e, infelizmente, factual sobre o abuso, o trauma, a cultura de diferentes época (vide na sensacional cena em que Jenny e sua mãe discutem) e o poder da memória. Nesse contexto, sua condução narrativa diverge entre o passado e presente de forma sempre orgânica respondendo idilicamente as dúvidas/subconsciente da protagonista.

   Todos os transgressores de seu abuso relatam suas versões, como se eles estivessem sendo entrevistados. Versões estas passadas, porém cada vez mais intensas e ganhando um grau de realismo crescente na memória de Jenny. E tecnicamente a direção de Fox é certeira ao brincar com a contraposição imagética entre o presente e passado, entregando cenas comoventes e criativas.               

   Não só isso, o design de produção entre os dois tempos é minucioso e importante ao facilitar a adaptação do espectador com os dois períodos. A princípio, o primeiro ato pode dificultar e soar arrastado, mas nada que impeça o prosseguimento da produção.  A edição e principalmente a montagem também merecem aplausos ao transitar perfeitamente entre o presente e passado (vide na cena quando Jenny está aprendendo a andar a cavalo).   

      Já o elenco, TODOS merecem destaques! Laura Dern, Elizabeth Debicki, Frances Conroy, Ellen Burstyn, John Heard e Jason Ritter estão excelentes em seus respectivos papeis. Com maiores destaques a Dern vivendo a conturbada, inquieta e perdida Jennifer adulta. Ritter dispensa comentários ao entregar um personagem tão humano, mas tão asqueroso e não duvido seu nome estar em grandes premiações. A Burstyn mesmo com poucas cenas mostra-se o porquê é uma grande atriz.      

       Definitivamente, o filme soube realçar cada valor de seu tema causando um misto de sentimentos a cada um de nós, principalmente quando estamos de frente a uma história real e não fictícia.  Com cenas memoráveis, angustiantes, atrozes, com uma mensagem poderosa e oportuna nos dias atuais, ‘O Conto’ é necessário para todos.


NOTA: 9,3