O amor, a guerra e a música atravessam o tempo de mãos
atadas em ‘Guerra Fria’. Diferente das convenções narrativas dos romances
atuais, a produção polonesa sob o comando do engenhoso cineasta Pawel
Pawlikowski (conhecido pelo excelente ‘Ida’ -2013) retoma os ares dos grandes
clássicos e presenteia a todos com um romance único, humanista, literato e
poético.
Representando a Polônia no Oscar 2019, 'Zimna Wojna' (do
original) acompanha as idas e vindas do casal Zula (Joanna Kulig) e Wiktor
(Tomasz Kot), incluindo viagens em diferentes países e separações impossíveis
de ter voltas, durante a Guerra Fria entre a Polônia stalinista e a Paris
boêmia dos anos 50.
Seguindo os moldes da cinematografia de seu último projeto
em ‘Ida’, o cineasta Pawel Pawlikowski repete o preto e branco, além da
proporção 4:3, tornando a película com um aspecto mais quadrado. O resultado é
deslumbrante! Transportando o espectador ao clima da década de 50, cada frame é
um wallpaper, onde a fotografia invade a tela nos fortes contrastes de luz e
sombra concedendo as mais belas imagens das apresentações dos personagens, do
casal, dos cenários quase barrocos artisticamente com enquadramentos bem
elaborados reforçando a narrativa.
Motivos do preto e branco e do confinamento de uma tela
quase que quadrada, também está diante da odisseia do amor musical enfrentados
pelo casal. Wiktor é metódico, sério, quieto, mas se perde aos encantos e
talentos daquela que fora um dia sua aluna, a Zula. Esta, jovem e promissora,
com um talento descomunal quando sobe nos palcos para cantar, sem contar sua
energia positiva e seu espírito independente (na atuação espetacular da atriz
Joanna Kulig ofuscando qualquer um em cena). E os dois, apaixonados, devem
enfrentar os percalços desse amor ora próximo, ora distante, fazendo maior
alusão ao título do filme.
Dessa maneira, brilha a direção de Pawlikowski ao expressar
a conservação dos sentimentos mediante as constantes transformações sociais.
Nesse contexto, ‘Guerra Fria’ retrata a guerra pelos efeitos psicológicos nos
protagonistas, ao invés da política interna dos países envolvidos. Nessas
circunstâncias, estamos diante de sucessivas frustrações efêmeras em uma
história feita de meios encontros e de finais, por pouco, felizes. E todos
esses fatores são reforçados com a técnica invejável de Pawlikowski. A condução
elegante, plástica e soberba pela montagem composta ao ritmado dinamismo com a
quietude naturalista, este valorizando as emoções, as imagens e expressões sem
pronunciar uma única palavra. Alcançando, assim, os resultados mais expressivos
possíveis.
Onde a mensagem final surge nas metáforas das mais poéticas
frases. “O pendulo matou o tempo...” e “A vista é melhor do outro lado...”
Concluímos que já não se faz mais romance como ‘Guerra Fria’ nos dias de
hoje.
NOTA: 10